top of page
manualpraticodomilitar.png
CAPÍTULO 6 - REPRESENTAÇÃO POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM

6.4. COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR MILITARES DAS FORÇAS ARMADAS E A PRESCRIÇÃO

 

Os Comandantes das Forças Armadas possuem foro especial por prerrogativa de função perante o STF em caso de cometimento de infrações penais comuns e de crimes de responsabilidade, ressalvada a competência do Senado Federal.

As normas constitucionais que tratam do foro especial dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica são as seguintes:

 

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:

(...)

c) nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ressalvado o disposto no art. 52, I, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente;

(…)

 

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

(…)

 

Após a leitura dessas normas constitucionais, pode-se afirmar que os Comandantes das Forças Armadas são detentores de foro privilegiado (prerrogativa de foro) na ação civil de improbidade administrativa? O foro especial por prerrogativa de função se aplica aos agentes públicos praticantes de atos de improbidade administrativa?

Várias foram as controvérsias sobre esse tema1, porém já está pacificado no STF que não existe foro privilegiado em sede de ação de improbidade administrativa:

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECLAMAÇÃO. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA NÃO CONFIGURADA. INEXISTÊNCIA DE PRERROGATIVA DE FORO EM AÇÕES DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA DO PRIMEIRO GRAU DE JURISDIÇÃO. AFRONTA À AUTORIDADE DA DECISÃO PROFERIDA POR ESTA CORTE NA ADI 2.797/DF NÃO CONFIGURADA. Sedimentou-se, nesta Corte Suprema, o entendimento de que competente o primeiro grau de jurisdição para julgamento das ações de improbidade administrativa contra agentes políticos, ocupantes de cargos públicos ou detentores de mandato eletivo, independentemente de estarem, ou não, em atividade. Precedentes. Agravo regimental conhecido e não provido. (STF - Rcl nº 14954 AgR – 1ª Turma - Relatora Ministra Rosa Weber - DJe de 14.04.2016)

 

DIREITO CONSTITUCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL EM PETIÇÃO. SUJEIÇÃO DOS AGENTES POLÍTICOS A DUPLO REGIME SANCIONATÓRIO EM MATÉRIA DE IMPROBIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DO FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO À AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. 1. Os agentes políticos, com exceção do Presidente da República, encontram-se sujeitos a um duplo regime sancionatório, de modo que se submetem tanto à responsabilização civil pelos atos de improbidade administrativa, quanto à responsabilização político-administrativa por crimes de responsabilidade. Não há qualquer impedimento à concorrência de esferas de responsabilização distintas, de modo que carece de fundamento constitucional a tentativa de imunizar os agentes políticos das sanções da ação de improbidade administrativa, a pretexto de que estas seriam absorvidas pelo crime de responsabilidade. A única exceção ao duplo regime sancionatório em matéria de improbidade se refere aos atos praticados pelo Presidente da República, conforme previsão do art. 85, V, da Constituição. 2. O foro especial por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal em relação às infrações penais comuns não é extensível às ações de improbidade administrativa, de natureza civil. Em primeiro lugar, o foro privilegiado é destinado a abarcar apenas as infrações penais. A suposta gravidade das sanções previstas no art. 37, § 4º, da Constituição, não reveste a ação de improbidade administrativa de natureza penal. Em segundo lugar, o foro privilegiado submete-se a regime de direito estrito, já que representa exceção aos princípios estruturantes da igualdade e da república. Não comporta, portanto, ampliação a hipóteses não expressamente previstas no texto constitucional. E isso especialmente porque, na hipótese, não há lacuna constitucional, mas legítima opção do poder constituinte originário em não instituir foro privilegiado para o processo e julgamento de agentes políticos pela prática de atos de improbidade na esfera civil. Por fim, a fixação de competência para julgar a ação de improbidade no 1o grau de jurisdição, além de constituir fórmula mais republicana, é atenta às capacidades institucionais dos diferentes graus de jurisdição para a realização da instrução processual, de modo a promover maior eficiência no combate à corrupção e na proteção à moralidade administrativa. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - Pet nº 3240 AgR -Tribunal Pleno – Relator Ministro Teori Zavascki - DJe de 22.08.2018)

 

Caberá à Justiça Federal de 1º grau2 processar e julgar a Ação Civil Pública de Improbidade Administrativa movida contra agentes públicos, incluindo-se os militares das Forças Armadas, e até mesmo os seus respectivos Comandantes.

Como exemplo de ação civil pública ajuizada pelo MPF contra militar, podemos citar a seguinte decisão do TRF5:

 

AÇÃO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MILITAR. ALTERAÇÃO DE DOCUMENTO PRODUZIDO POR INFERIOR HIERÁRQUICO. AUSÊNCIA DE PROVA DA AUTORIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. I - Trata-se de remessa oficial de sentença que julgou improcedente o pedido deduzido na presente Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra oficial do Exército Brasileiro, sob o argumento de que o mesmo praticara atos regulados no art. 11, inciso I, da Lei nº 8.429, de 3 de junho de 1992. II – Segundo consta na inicial da ação, o réu, na condição de Comandante do 4º Batalhão de Polícia do Exército, teria modificado o conteúdo de correspondência eletrônica que lhe fora encaminhada por inferior hierárquico, inserindo expressão que configuraria ato de indisciplina de caráter coletivo dirigido a autoridade militar, com vistas a ameaçar a instituição do Exército, aplicando-lhe, em conseqüência, a pena de prisão. Segundo, ainda, o MPF, o coronel seria o responsável pelo posterior desaparecimento dos autos do processo administrativo respectivo. III - No entanto, a imputação da conduta violadora dos princípios da administração pública (art. 11 da Lei nº 8.429/92) não se encontra respaldada por um suporte probatório mínimo. O fato de haver alteração no original da correspondência eletrônica enviada pelo subordinado não é sequer indício de que o superior hierárquico a quem fora endereçada a correspondência tenha sido o autor da alteração. Tampouco há sequer indícios de que o réu fora responsável pelo sumiço dos autos do processo administrativo disciplinar. IV - Não há ação típica, porquanto não se indica qual seria o ato praticado pelo Coronel, individualizando-se a sua conduta e adequando-a aos comandado da Lei de Improbidade Administrativa. A sentença que decretou a extinção do processo, julgando pela improcedência do pedido, portanto, deve ser mantida em sua integralidade. V - Remessa oficial improvida. (TRF5 – REEX nº 444.272/PE – 4ª Turma – Relator Desembargador Federal Marco Bruno Miranda - DJ de 16.01.2009)

 

As situações em que haverá a suspensão ou interrupção da prescrição estão definidas nos parágrafos deste art. 23.

Existe uma interessante inovação trazida pela Lei nº 14.230/2021 que é a inclusão do § 20 no art. 17 da Lei nº 8.429/1992, entretanto, de difícil aplicabilidade no âmbito militar:

§ 20 A assessoria jurídica que emitiu o parecer atestando a legalidade prévia dos atos administrativos praticados pelo administrador público ficará obrigada a defendê-lo judicialmente, caso este venha a responder ação por improbidade administrativa, até que a decisão transite em julgado.

 

Será de difícil aplicabilidade no âmbito das Forças Armadas pelo fato de que, em regra, a assessoria jurídica das OMs é composta por assessores jurídicos que são militares da ativa, logo, não são Advogados. E por não serem Advogados, não poderão defender, judicialmente, militares sujeitos à Ação de Improbidade Administrativa perante a Justiça Federal Comum.

Geralmente, quando existe, por exemplo, uma acusação contra algum Comandante por ato de crimes licitatórios no âmbito militar, em regra, este acusado se defende com a afirmação de que seguiu as orientações e/ou pareceres jurídicos da assessoria jurídica do quartel, todavia, conforme dito acima, em regra, essa assessoria jurídica é composta por militares da ativa que estão proibidos de serem Advogados por imposição do inciso VI do art. 28 da Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil) e, consequentemente, não possuem capacidades postulatórias para defenderem esse acusado em Juízo.

Então, em sendo a assessoria jurídica, que emitiu o parecer mencionado no § 20 no art. 17, composta somente por militares da ativa, não será possível que esta faça a defesa do militar acusado de atos de improbidade administrativa e, neste caso, caberá à Advocacia da União defender esse militar.

A Lei nº 14.230/2021 incluiu 2 (dois) importantes parágrafos no art. 21 da Lei nº 8.429/1992:

 

§ 3º As sentenças civis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria.

§ 4º A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com todos os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).

 

As instâncias administrativa, cível e penal são independentes, entretanto, em ocorrendo alguma das situações dispostas nos parágrafos acima, haverá repercussão na ação de improbidade administrativa.

___________________________

1Até por meio de lei se tentou blindar os detentores de foro privilegiado na ação de improbidade, todavia, o STF, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.797/DF, julgou-a procedente para declarar a Lei nº 10.628/2002 (alterava o art. 84 do CPP) inconstitucional, decidindo-se que não havia foro privilegiado para os agentes públicos processados por atos de improbidade administrativa.

2AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL DE 1º GRAU. CUMULAÇÃO DE PEDIDOS DIVERSOS CONTRA RÉUS DIFERENTES. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO. ATO DE IMPROBIDADE. INEXISTÊNCIA DE MÁ-FÉ OU DOLO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. SENTENÇA MANTIDA, POR FUNDAMENTOS DIVERSOS. 1. Tratando-se de ação civil pública por improbidade administrativa, esta deve ser ajuizada perante magistrado de primeiro grau, independentemente de eventual foro por prerrogativa de função, em correlata ação criminal. 2. Ademais, o caso não importa em perda de cargo público de réu com foro privilegiado, em instância criminal. 3. Outrossim, a ação tem entre os réus ex-Presidente do Banco Central do Brasil e os fatos relacionam-se a período anterior à lei 11036/2004 que atribuiu status de ministro ao presidente da autarquia, não podendo a lei ser aplicada retroativamente. 4. Incompetência da justiça federal de primeira instância que se rejeita. 5. É inviável a cumulação de pedidos diversos face a réus diferentes, em ação de improbidade administrativa e ação civil pública para reparação de danos a investidores privados. 6. Mostra-se inadequada a ação de improbidade para a reparação, às custas do patrimônio de empresa pública, de prejuízos causados a investidores privados. 7. Apenas e quando a irregularidade administrativa é coadjuvada pela má-fé, pelo dolo, hipótese não demonstrada na peça inicial e que não se pode apreender do contexto dos fatos narrados, é que se pode cogitar de ato de improbidade. 8. Sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito que se mantém, por fundamentos diversos. 9. Apelação improvida. (TRF1 - AC nº 200234000330930 - 3ª Turma – Relator Juiz Federal convocado Renato Martins Prates - e-DJF1 de 07.06.2013)

bottom of page