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CAPÍTULO 4 - HABEAS CORPUS NAS TRANSGRESSÕES DISCIPLINARES

4.11. A AUTORIDADE COATORA ESTÁ PASSÍVEL DE SER PROCESSADA CRIMINALMENTE POR ALGUM CRIME, CASO A PRISÃO DISCIPLINAR SEJA CONSIDERADA ILEGAL PELO PODER JUDICIÁRIO?

 

A resposta a essa indagação pode ser respondida através do art. 6531 do CPP, do art. 1952 do Regimento Interno do STF e do art. 2053 do Regimento Interno do STJ, que preveem o que poderá ocorrer quando for constatado nos autos do writ que a prisão for efetivada4 por má-fé ou evidente abuso de poder.

O delito de abuso de autoridade não está previsto no CPM e nem em outra lei penal militar, todavia, aplicar-se-á aos militares a Lei nº 13.869/2019, sendo que o processo e o julgamento tramitarão na Justiça Militar por imposição do inciso II do art. 9º do CPM.

Importante esclarecer que a Súmula nº 1725 do STJ está superada, não mais tendo aplicação, haja vista que, a partir de 2017 (Lei nº 13.491/2017 que modificou o inciso II do art. 9º do CPM), a competência para processar e julgar militares pela prática do crime de abuso de autoridade passou a ser da Justiça Militar.

Importante destacar fato ocorrido comigo quando a Justiça Federal comum detinha competência para processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade com base na Súmula nº 172 do STJ, onde um Coronel foi investigado e processado, tendo, antes, sido investigado pelo Ministério Público Federal após efetivação de representação criminal formulada por mim e tal episódio foi divulgado por Jornal de grande circulação de Natal/RN. Consta, inclusive, em matéria jornalística que a soltura foi mediante habeas corpus, onde um Juiz Federal concluiu pela ilegalidade da prisão.

Em consequência da concessão do habeas corpus por um Juiz Federal e da representação criminal efetivada por mim perante o MPF, o Procurador da República apresentou denúncia contra o Coronel, sendo essa recebida pelo Juiz Federal e assim instaurada a competente Ação Penal Pública pelo cometimento do crime de abuso de autoridade. Tanto o MPF quanto o Judiciário Federal do Rio Grande do Norte entenderam que era possível a transação penal6 para delitos de abuso de autoridade. Logo, a autoridade coatora militar foi beneficiada, e obviamente, concordou com a proposta do MPF, a fim de que não fosse julgada e condenada por penas privativas de liberdade ou restritivas de direitos.

O Coronel participou da audiência criminal7 mesmo estando na reserva remunerada, ou seja, não há como fugir da aplicação da lei penal pelo simples fato de estar fora do serviço ativo. Ressalte-se que o Coronel, em audiência criminal, aceitou todos os termos do acordo criminal e certamente, se tivesse permanecido na ativa, tomaria mais cuidado ao prender outros militares. Sem dúvidas tal acordo criminal8 foi um grande negócio para o Coronel, e é uma prova para todos os militares de que as autoridades militares que abusam de sua autoridade podem ser punidas criminalmente.

Seria muito interessante se todos os superiores hierárquicos tivessem a consciência de que podem ser processados da mesma forma que esse Coronel, pois assim, quem sabe passariam a cumprir com mais atenção a CF/88 e demais normas infraconstitucionais.

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1Art. 653. Ordenada a soltura do paciente em virtude de habeas corpus, será condenada nas custas a autoridade que, por má-fé ou evidente abuso de poder, tiver determinado a coação.

Parágrafo único. Neste caso, será remetida ao Ministério Público cópia das peças necessárias para ser promovida a responsabilidade da autoridade.

2Art. 195. Ordenada a soltura do paciente, em virtude de habeas corpus, a autoridade que, por má-fé ou evidente abuso de poder, tiver determinado a coação, será condenada nas custas, remetendo-se ao Ministério Público traslado das peças necessárias à apuração de sua responsabilidade penal.

3Art. 205. Ordenada a soltura do paciente, em virtude de habeas corpus, a autoridade que, por má-fé ou evidente abuso de poder, tiver determinado a coação, será condenada nas custas, remetendo-se ao Ministério Público traslado das peças necessárias à propositura da ação penal.

4O artigo cita o Ministério Público, que é nesse caso, o detentor exclusivo da ação penal. Entretanto, ressalte-se que o próprio impetrante ou paciente, ou mesmo terceiros podem, mediante representação criminal dirigida ao Ministério Público, solicitar que este efetue a denúncia por crime de abuso de autoridade para o início da ação penal (ver Capítulo 5).

5SÚMULA nº 172 do STJ: Compete à Justiça comum processar e julgar militar por crime de abuso de autoridade, ainda que praticado em serviço.

6Ver subtópico 5.7.

7A audiência ocorreu no município onde o militar da reserva fixou residência por meio de carta precatória, embora o processo criminal tenha sido instaurado em Natal/RN. E claro que o acusado teve que contratar Advogado e cumprir todo o acordo criminal firmado com o Ministério Público.

8O que aconteceria se o Coronel não tivesse aceitado o acordo? Provavelmente seria condenado por crime de abuso de autoridade.

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