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CAPÍTULO 2 - SINDICÂNCIA NA ESFERA MILITAR

2.5. RESULTADO DA SINDICÂNCIA E PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR

Como já dito, a sindicância é, em regra1, um procedimento investigatório sumário, logo, não é legal a punição de militares com base somente em sua conclusão2. Em sendo constatado ao final da sindicância que o militar, por exemplo, cometeu uma transgressão disciplinar, será obrigatória a instauração de processo administrativo militar.

Entretanto, se a sindicância conceder ao investigado os direitos ao contraditório e à ampla defesa, possuindo, assim, natureza processual, será possível, conforme já explicado anteriormente, a aplicação de punição sem a necessidade da abertura de novo processo disciplinar.

O STJ já teve oportunidade de informar que a sindicância militar é um procedimento inquisitorial, prévio à acusação e anterior ao processo administrativo disciplinar:

 

RECURSO ORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. MILITAR. IRREGULARIDADES COMETIDAS EM ÓRGÃO DIVERSO. TRANSFERÊNCIA PARA A RESERVA. SINDICÂNCIA. AUSÊNCIA DE DEFENSOR. DESNECESSIDADE. PENA APLICADA DIVERSA DAQUELA SUGERIDA PELO CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO. POSSIBILIDADE DESDE QUE FUNDAMENTADA. AUSÊNCIA DE TIPIFICAÇÃO LEGAL. NÃO-OCORRÊNCIA. CONDUTA REALIZADA EM OUTRO ÓRGÃO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE PENA. PRINCÍPIOS MILITARES. IRRADIAÇÕES FORA DA CORPORAÇÃO. 1. O ente estatal que vai suportar o ônus de uma possível concessão da segurança tem legitimidade para responder o mandado de segurança, em que figura como impetrado autoridade componente de tal ente. Precedentes. 2. Não há que se falar em nulidade da sindicância por ausência de contraditório e ampla defesa, porquanto a sindicância visa apurar a ocorrência de infrações administrativas, sem estar dirigida, desde logo, à aplicação de sanção, tratando-se apenas de procedimento inquisitorial, prévio à acusação e anterior ao processo administrativo disciplinar, ainda sem a presença obrigatória de acusados. Precedentes. 3. A análise das provas pela autoridade superior foi devidamente realizada e consistentemente fundamentada, daí porque não há vício capaz de anular o processo administrativo disciplinar em razão da conclusão de tal autoridade ter sido divergente daquela exarada pelo Conselho de Justificação. 4. A conclusão a que chegou o Comandante Geral, acatada pelo Governador do Estado, foi estribada na legislação estadual, indicando sua transferência para a reserva remunerada, agindo de acordo com os ditames legais e aplicando exatamente a tipificação prevista na Lei Estadual nº 3.595/77. 5. Não cabe ao Judiciário rever o mérito da decisão administrativa disciplinar militar, razão pela qual se realizada esta de acordo os procedimentos legais previstos para a espécie, a pena aplicada, se condizente com a determinação legal, é juízo de mérito administrativo. 6. Os princípios que regem a vida militar (decoro e ética) irradiam sua aplicação tanto no âmbito da corporação, como fora dela. Portanto, se entendeu a autoridade superior que as condutas praticadas pelo recorrente eram imorais ou ilegais, ainda que realizadas em órgão diverso daquele a que pertencia o impetrante, não há ilegalidade neste julgamento, tampouco, como já referido, pode ser revista a sua conclusão, sob pena de se incursionar na discricionariedade administrativa. 7. Recurso ordinário improvido. (STJ – RMS nº 15037/BA - 6ª Turma - Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura - DJ de 27.05.2008)

 

O TRF1 já decidiu que a sindicância não é o instrumento adequado para aplicar penalidade ao militar, em virtude de ser um procedimento sumário3 investigatório:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. NULIDADE DE ATO ADMINISTRATIVO. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO. INAFASTABILIDADE. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS AOS LITIGANTES EM GERAL. 1. A sindicância, meio sumário para a elucidação preliminar de fatos não é idôneo para a apuração de falta grave e aplicação de penalidade de licenciamento. Caso em que, ademais, não foram asseguradas ao militar as garantias do contraditório e da ampla defesa, constitucionalmente consagradas (art. 5º, LV). 2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento no sentido de que "a partir do momento em que a exclusão se faz considerados certos fatos, a macularem a conduta do policial militar, indispensável é a observância do devido processo legal, estabelecendo-se o contraditório e viabilizando-se o exercício do lídimo direito de defesa" (RE n. 191.480-7/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, in DJU de 26/4/96), porquanto o preceito constitucional inserto no art. 5º, LV, da CF/88 não faz distinção entre civis e militares (AgRg no RE n. 206.775-0/PE, REl. MIN. Ilmar Galvão, in DJU de 15/09/95). 3. Assim, o desligamento do autor das fileiras do Exército, sem apuração da suposta falta através de procedimento administrativo regular, com oportunidade de contraditória e ampla defesa, enseja a nulidade do ato administrativo correspondente. Precedentes do TRF (AC 92.01.21290-9/MG; REO 91.01.13534-1/DF). 4. Sentença confirmada. Remessa a que se nega provimento. (TRF1 – REEX nº 199701000016510/RR – 1ª Turma – Relatora Juíza Federal Mônica Neves Aguiar – DJ de 20.03.2000)

 

Entretanto, ratifique-se, que se o militar tiver exercido4, plenamente, seu direito constitucional ao contraditório e à ampla defesa na sindicância, poderá5 ser punido disciplinarmente independentemente de instauração de outro processo disciplinar.

Então, percebe-se que, dependendo da espécie de sindicância, será necessária a instauração de processo administrativo disciplinar específico para se poder punir o militar.

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1Conforme dissertado anteriormente, se na sindicância for permitido ao militar o direito ao contraditório e à ampla defesa, nos termos constitucionais, não será necessário a instauração de processo disciplinar específico para punir o militar pelo cometimento de transgressão disciplinar sobre fatos investigados nesta sindicância.

2O prazo para a conclusão da sindicância vai depender da norma de cada Força Armada ou cada Força Auxiliar de cada Estado. Ex.: Aeronáutica: 15 (quinze) dias e Exército: 30 (trinta) dias.

 

3CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AGRAVO LEGAL - ART. 557, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO MILITAR - TRANSGRESSÃO DISCIPLINAR DE MILITAR - INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA - AGRAVO LEGAL IMPROVIDO. 1. O autor foi nomeado para apurar, através de sindicância, fatos ocorridos no 4° Esquadrão de Fuzileiros Blindados referentes ao uso de entorpecentes por parte de soldados da referida unidade militar, sendo que, no decorrer da sindicância, vislumbrou-se uma possível participação de oficiais e de sargentos na distribuição de entorpecentes no aquartelamento do 20° Regimento de Cavalaria Blindado. 2. Após a participação em tais investigações, afirmou o autor que passou a sofrer "perseguição" em virtude das informações apuradas, o que acarretou evidente prejuízo a sua vida funcional. 3. É certo que a singularidade da carreira militar mereceu da lei a autorização para que infrações dos servidores públicos militares fossem averiguadas mediante meios sumários; mas meios sumários não têm qualquer semelhança com ausência de exercício do direito de defesa. 4. O direito de defesa - que se estende para o âmbito administrativo - encontra base no artigo 5°, inciso LV, da Magna Carta. 5. No âmbito do processo disciplinar, mesmo que sumário como ocorre entre os militares, o acusado tem o direito de saber o motivo pelo qual está sendo processado, o de responder a acusação e o de indicar e produzir as provas que entender pertinentes, ou seja, tem o direito de se defender previamente antes de qualquer decisão que venha a prejudicá-lo. 6. Mesmo havendo a necessidade de procedimentos sumários para manter-se o controle hierárquico, os institutos do contraditório e da ampla defesa devem ser sempre respeitados. 7. In casu não foram obedecidos os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa na aplicação "mais do que sumária" das punições; ou seja, o autor foi várias vezes punido sem lhe ter sido assegurada oportunidade de defesa. 8. Recurso adesivo improvido no tocante ao pedido de indenização. Trata-se, no caso, de pedidos alternativos, previstos no artigo 288 do Código de Processo Civil. Assim, o atendimento de um dos pedidos descarta a aceitação dos demais. Portanto, como a r. sentença acolheu o pedido de reintegração, não há que se falar no pagamento de indenização. 9. Despropositado o pedido feito no apelo adesivo de cancelamento de punições, posto que o desfecho dado ao caso serviu-se do mau procedimento da Administração Militar em relação às punições aplicadas para atingir um resultado mais abrangente em favor do autor. 10. Inexistência de ilegalidade na fixação dos honorários advocatícios no percentual equivalente a 5% (cinco por cento) do valor da condenação, tendo em vista que atende ao disposto no artigo 20, § 4°, do Código de Processo Civil. 11. Agravo legal improvido. (TRF3 - AC nº 00037203719964036000 – 1ª Turma – Relator Desembargador Federal Johonsom Di Salvo - e-DJF3 de 18.02.2011)

5Ressalte-se que não há qualquer problema em ser instaurado processo disciplinar após conclusão de sindicância que tenha oferecido o direito ao contraditório e à ampla defesa. O militar será beneficiado se isso ocorrer, pois terá nova oportunidade para apresentar defesa.

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