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CAPÍTULO 19 - EFEITOS JURÍDICOS DA CONDENAÇÃO PENAL NA JUSTIÇA MILITAR

19.6. EXCLUSÃO DAS FORÇAS ARMADAS: PENA ACESSÓRIA

 

Como já dito anteriormente, a exclusão de Praças das Forças Armadas é uma pena acessória, e não efeito da condenação, nos termos do art. 102 do CPM.

Quanto aos Oficiais das Forças Armadas, a demissão em decorrência de condenação penal à pena restritiva de liberdade superior a 2 (dois) anos, somente será possível mediante decisão do STM em sede de Representação formulada pelo MPM, conforme previsões dispostas nos incisos VI e VII do § 3º do art. 142 da CF/88 c/c os arts. 118 e 120 da Lei nº 6.880/1980:

 

Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.

(…)

§ 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições:

(…)

VI - o oficial só perderá o posto e a patente se for julgado indigno do oficialato ou com ele incompatível, por decisão de tribunal militar de caráter permanente, em tempo de paz, ou de tribunal especial, em tempo de guerra;

VII - o oficial condenado na justiça comum ou militar a pena privativa de liberdade superior a dois anos, por sentença transitada em julgado, será submetido ao julgamento previsto no inciso anterior;

(...)

 

Art. 118. O oficial perderá o posto e a patente se for declarado indigno do oficialato, ou com ele incompatível, por decisão do Superior Tribunal Militar, em tempo de paz, ou de Tribunal Especial, em tempo de guerra, em decorrência de julgamento a que for submetido.

(...)

 

Art. 120. Ficará sujeito à declaração de indignidade para o oficialato, ou de incompatibilidade com o mesmo, o oficial que:

I - for condenado, por tribunal civil ou militar, em sentença transitada em julgado, à pena restritiva de liberdade individual superior a 2 (dois) anos;

(...)

 

A alínea h do inciso I do art. 6º da Lei nº 8.457/1992 prevê que o STM processará e julgará originalmente a representação contra o Oficial:

 

Art. 6°. Compete ao Superior Tribunal Militar:

I - processar e julgar originariamente:

(...)

h) a representação para decretação de indignidade de oficial ou sua incompatibilidade para com o oficialato;

(...)

 

Essa representação é efetivada pelo MPM, conforme inciso II do art. 116 da LC nº 75/1993:

 

Art. 116. Compete ao Ministério Público Militar o exercício das seguintes atribuições junto aos órgãos da Justiça Militar:

(…)

II - promover a declaração de indignidade ou de incompatibilidade para o oficialato;

(...)

 

Segue abaixo um trecho da petição inicial do MPM referente à Representação para Declaração de Indignidade para o Oficialato nº 0000148-28.2017.7.00.0000 contra um Coronel do Exército que foi condenado a 10 (dez) anos de reclusão por incursão no art. 251 do CPM:

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR, por seu Procurador-Geral, no uso das atribuições previstas no artigo 123 da Lei Complementar 75/93 e no artigo 1121 do RISTM e com fundamento nas peças informativas anexas (Procedimento Administrativo 14-56.2017.1000), vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor, em atenção ao previsto no art. 142, § 3º, VI e VII, da Constituição da República Federativa do Brasil, a presente REPRESENTAÇÃO PARA DECLARAÇÃO DE INDIGNIDADE PARA COM O OFICIALATO em desfavor do Coronel da Reserva Remunerada do Exército (nome excluído intencionalmente), qualificado na documentação anexada, de acordo com os argumentos fáticos e jurídicos a seguir expostos:

O Coronel (nome excluído intencionalmente) foi processado pela Justiça Militar da União e condenado pelo Superior Tribunal Militar, em sede de apelação, à pena de 10 anos de reclusão pela prática de estelionato em detrimento da administração militar (art. 252, § 3º, do Código Penal Militar) (fls. 249), por decisão transitada em julgado em 10 de dezembro de 2016 (fls. 2).

Isso porque, no âmbito do Comando da 1ª Região Militar, onde exerceu as funções de Chefe de Finanças e de Ordenador de Despesas, o representado orquestrou um esquema de desvio de verbas em concluio com outros militares e civis, no período de 1993 e 2003.

(...)

 

Nessa representação, o STM considerou esse Coronel indigno do Oficialato e, consequentemente, decretou a perda do seu posto e patente, conforme se observa na respectiva ementa:

 

REPRESENTAÇÃO PARA DECLARAÇÃO DE INDIGNIDADE/INCOMPATIBILIDADE PARA COM O OFICIALATO. PROCURADORIA-GERAL DA JUSTIÇA MILITAR. OFICIAL SUPERIOR. CONDENAÇÃO POR ESTELIONATO. PENA SUPERIOR A DOIS ANOS. TRÂNSITO EM JULGADO. CONDUTA INDIGNA. PERDA DO POSTO E DA PATENTE. UNANIMIDADE. Consoante a dicção do artigo 142, § 3º, incisos VI e VII, da Constituição Federal, combinado com o art. 112 do Regimento Interno do Superior Tribunal Militar, o Oficial condenado na justiça comum ou militar à pena privativa de liberdade superior a 2 (dois) anos, por Sentença transitada em julgado, será submetido a julgamento por Tribunal Militar, de caráter permanente, onde serão avaliados os efeitos da conduta que determinou a condenação do Oficial, à luz dos preceitos éticos e morais descritos no Estatuto dos Militares. As matérias penais decididas na instância criminal não mais estão sujeitas a deliberação nesta sede, haja vista que a Representação para Declaração de Indignidade/Incompatibilidade para com o Oficialato, embora originada do processo-crime, não tem o condão rescisório, não cabendo a esta Corte Castrense emitir qualquer juízo de valor acerca do acerto ou desacerto da condenação imposta ao Representado, bem como aferir vícios nela porventura existentes. Os militares das Forças Armadas, além de lidarem com valores únicos como a vida e a soberania do Estado, também lidam com o patrimônio e a ordem pública, o que lhes exige retidão de comportamento, inclusive na vida particular. Para os Oficiais, o rigorismo quanto à observância desses mandamentos é ainda maior, pois representam modelos paradigmáticos a serem seguidos por seus subordinados. O delito de estelionato cometido por Oficial Superior do mais alto posto atinge, com gravidade, o conjunto de atributos morais e éticos insculpidos no Estatuto dos Militares, pois o sentimento do dever, o pundonor, a conduta socialmente irrepreensível, a eficiência, a probidade, o zelo com a coisa pública e os demais valores morais previstos na legislação de regência representam conceitos que, se desprezados, inviabilizam a permanência do Oficial na vitaliciedade militar. Representação acolhida, declarando o Representado indigno do Oficialato e determinando a perda de seu posto e de sua patente. Unanimidade. (STM - Representação p/ Declaração de Indignidade/Incompatibilidade nº 0000148-28.2017.7.00.0000 – Relator Ministro Cleonilson Nicácio Silva – DJe de 08.02.2018)

 

O art. 34 do Decreto nº 4.502/2002 (Aprova o Regulamento para o Corpo de Oficiais da Reserva do Exército - R-68) informa que os Oficiais temporários serão licenciados em caso de condenação transitada em julgado:

 

Art. 34. Os oficiais temporários submetidos a processo em foro militar ou civil e que venham a ser condenados por decisão transitada em julgado serão licenciados, nos termos da legislação específica.

 

A alínea b do inciso I do art. 50 do Decreto nº 4.780/2003 (Aprova o Regulamento da Reserva da Marinha e dá outras providências) prevê que o Oficial temporário RM2 ou RM3 serão licenciados se condenados por crime doloso com trânsito em julgado:

 

Art. 50. Serão licenciados do SAM, ex officio, por conveniência do serviço:

I - o Oficial ou o Guarda-Marinha RM2 ou RM3 que:

(...)

b) for condenado, em sentença irrecorrível, por crime doloso;

(...)

 

O art. 39 e o inciso II do art. 42 do Decreto nº 6.854/2009 (Dispõe sobre o Regulamento da Reserva da Aeronáutica) preveem que o Oficial temporário e a Praça (não estabilizada) poderão ser licenciados se forem condenados por crime doloso com trânsito em julgado:

 

Art. 39. Licenciamento do serviço ativo é o ato pelo qual os Oficiais R/2 ou R/3 e as Praças da ativa são excluídos do serviço ativo e incluídos na Reserva não-Remunerada

 

Art. 42. O licenciamento do serviço, ex officio, por conveniência do serviço, poderá ser aplicado quando:

(...)

II - for condenado, em sentença irrecorrível, por crime doloso;

(...)

 

O art. 34-A da Lei nº 4.375/1964 (Lei do Serviço Militar), incluído pela Lei nº 13.954/2019, informa que os militares temporários indiciados em inquérito policial comum ou militar ou que forem réus em ações penais de igual natureza serão licenciados:

 

Art. 34-A. Os militares temporários indiciados em inquérito policial comum ou militar ou que forem réus em ações penais de igual natureza, inclusive por crime de deserção, serão licenciados ao término do tempo de serviço, com a comunicação à autoridade policial ou judiciária competente e a indicação dos seus domicílios declarados. (Incluído pela Lei nº 13.954, de 2019)

 

Obviamente esse art. 34-A é absolutamente inconstitucional, posto que fere, flagrantemente, o inciso LVII do art. 5º da CF/88:

 

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;

 

Os Oficiais temporários condenados à pena privativa de liberdade superior a 2 (dois) anos não serão, necessariamente, submetidos à declaração de indignidade ao oficialato, posto que, conforme legislação citada anteriormente, poderão ser licenciados nas situações previstas nas normas jurídicas de cada Força Armada, haja vista não serem Oficiais de carreira “vitalícios”.

A perda do posto e da patente do Oficial e a exclusão (expulsão) a bem da disciplina da Praça, mesmo sendo Praça estabilizada (com mais de 10 anos de tempo de serviço), não lhes conferem qualquer tipo de indenização ou remuneração, conforme previsões dispostas, respectivamente, nos arts. 119 e 127 da Lei nº 6.880/1980:

 

Art. 119. O oficial que houver perdido o posto e a patente será demitido ex officio sem direito a qualquer remuneração ou indenização e receberá a certidão de situação militar prevista na legislação que trata do serviço militar.

 

Art. 127. A exclusão da praça a bem da disciplina acarreta a perda de seu grau hierárquico e não a isenta das indenizações dos prejuízos causados à Fazenda Nacional ou a terceiros, nem das pensões decorrentes de sentença judicial.

Parágrafo único. A praça excluída a bem da disciplina receberá o certificado de isenção do serviço militar previsto na legislação que trata do serviço militar, sem direito a qualquer remuneração ou indenização.

 

A Praça condenada a pena superior a 2 (dois) anos, conforme incisos I e II do art. 125 do CPM, será excluída das Forças Armadas “a bem da disciplina”, logo, aplica-se o art. 127:

 

Art. 125. A exclusão a bem da disciplina será aplicada ex officio ao Guarda-Marinha, ao Aspirante-a-Oficial ou às praças com estabilidade assegurada:

I - quando assim se pronunciar o Conselho Permanente de Justiça, em tempo de paz, ou Tribunal Especial, em tempo de guerra, ou Tribunal Civil após terem sido essas praças condenadas, em sentença transitada em julgado, à pena restritiva de liberdade individual superior a 2 (dois) anos ou, nos crimes previstos na legislação especial concernente à segurança do Estado, a pena de qualquer duração;

II - quando assim se pronunciar o Conselho Permanente de Justiça, em tempo de paz, ou Tribunal Especial, em tempo de guerra, por haverem perdido a nacionalidade brasileira; e

(…)

Todavia, tanto o Oficial de carreira quanto a Praça2, esta apenas se for estabilizada, conforme disposição prevista no art. 20 da Lei nº 3.765/1960 (Lei da Pensão Militar nas Forças Armadas), deixarão a pensão militar aos seus beneficiários em valor proporcional ao tempo de serviço:

 

Art. 20. O oficial da ativa, da reserva remunerada ou reformado, contribuinte obrigatório da pensão militar, que perder posto e patente deixará aos seus beneficiários a pensão militar correspondente ao posto que possuía, com valor proporcional ao tempo de serviço. (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

Parágrafo único. Nas mesmas condições referidas no caput deste artigo, a praça contribuinte da pensão militar com mais de 10 (dez) anos de serviço expulsa ou não relacionada como reservista por efeito de sentença ou em decorrência de ato da autoridade competente deixará aos seus beneficiários a pensão militar correspondente à graduação que possuía, com valor proporcional ao tempo de serviço. (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

 

O TCU possui súmula sobre esse art. 20:

 

SÚMULA nº 169 do TCU: Para efeito de concessão da pensão militar, admite-se a equiparação e, em consequência, a igualdade de tratamento, do militar excluído ao expulso, ambos considerados falecidos (morte ficta), mesmo que a família se haja constituída após o desligamento e ainda que não tenham chegado a contribuir para o montepio militar, por ser superveniente à sua morte a lei que ensejou a contribuição.

 

Então, como observado na respectiva legislação castrense das Forças Armadas, o Oficial expulso pelo STM em caso procedência da Representação decorrente de condenação penal superior a 2 (dois) anos e a Praça estabilizada expulsa com a aplicação da pena acessória prevista no art. 102 do CPM não receberão remuneração ou indenização, todavia, seus beneficiários previdenciários receberão pensão militar, todavia, esta será no valor proporcional ao tempo de serviço.

____________________________

1Atualmente, está previsto no art. 115 do Regimento Interno do STM:

Art. 115. Transitada em julgado a sentença da Justiça comum ou militar que haja condenado o oficial das Forças Armadas à pena privativa de liberdade superior a dois anos, o Procurador-Geral da Justiça Militar formulará Representação para que o Tribunal julgue se o representado é indigno ou incompatível para com o oficialato.

2PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. CONTRADITA DE TESTEMUNHAS. ADMINISTRATIVO. MILITAR. PRAÇA ESTÁVEL EXCLUÍDA DO SERVIÇO ATIVO A BEM DA DISCIPLINA. PENSÃO POR MORTE FICTA INSTITUÍDA EM BENEFÍCIO DA ESPOSA. PRETENSÃO DA COMPANHEIRA DE DIVIDIR O BENEFÍCIO COM A VIÚVA APÓS O ÓBITO DO MILITAR. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. - O Eg. STJ já decidiu que o concubinato estabelece vínculo gerador de impedimento de testemunha. Evidenciada a incidência do art. 405, § 2º, inciso I, do Código de Processo Civil, não há ilegalidade na decisão que acolhe a contradita do irmão do de cujus, nem prejuízo dela decorrente, especialmente se aquele depõe como informante do Juízo. - Ao que se depreende do art. 414, § 1º, do CPC, o momento processual adequado para a arguição de incapacidade, impedimento ou suspeição de testemunha é o que antecede o depoimento, não podendo ser levantada depois de iniciado este, em virtude dos efeitos da preclusão. - Agravo retido a que se nega provimento. - Militar que, após alcançar a estabilidade, foi excluído do Serviço Ativo da Marinha a bem da disciplina, instituindo, em favor de sua esposa, pensão militar por morte ficta. A concessão deste tipo de benefício aos dependentes tem finalidade social, eis que visa a amparar a família do militar, motivo pelo qual foi integralmente conferido à esposa. - Não havendo notícia de reabilitação e posteriormente falecido o militar, à pensão decorrente de sua morte real não faz jus sua concubina. Ausente comprovação da existência de união estável como entidade familiar, única reconhecida e amparada pelo art. 226, § 3º da Constituição Federal. - Apelação improvida. (TRF1 – Apelação Cível nº 369.428 – 7ª Turma Especializada – Relator Desembargador Federal Theophilo Miguel - DJU de 07.12.2009).

ADMINISTRATIVO. MILITAR EXCLUÍDO DAS FORÇAS ARMADAS. PENSÃO. ART. 5º, § 1º do Decreto 49.096/60. NÃO COMPROVADA A SUBSISTÊNCIA DA UNIÃO ESTÁVEL À ÉPOCA DA EXCLUSÃO DO MILITAR. PEDIDO IMPROCEDENTE. A pensão militar pode ser requerida a qualquer tempo, consoante dispõe o art. 28 da Lei nº 3.765/60. Prescrição afastada. O benefício pretendido é garantido aos dependentes existentes à época dos fatos. A união estável não subsistia à época da exclusão do militar das Forças Armadas. Hipótese na qual a autora não pode ser enquadrada como beneficiária da pensão (artigo 7º da Lei 3765/1960), seja porque não comprovou a existência da união estável à época da exclusão, seja porque não recebia pensão alimentícia do militar. Remessa oficial e apelação providas para reconhecer a improcedência do pedido. (TRF3 - APELREEX nº 00250884420064036100 – 1ª Turma - Relator Desembargador Federal José Lunardelli - e-DJF3 de 14.09.2012)

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