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CAPÍTULO 19 - EFEITOS JURÍDICOS DA CONDENAÇÃO PENAL NA JUSTIÇA MILITAR

19.5. CONCESSÃO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA: SURSIS

 

Suspensão condicional da pena, mais conhecido como sursis, é matéria de direito penal, sendo um benefício conferido ao condenado à pena privativa de liberdade não superior a 2 (dois) anos na Justiça Militar, conforme previsão contida no art. 84 do CPM:

 

Pressupostos da suspensão

Art. 84. A execução da pena privativa da liberdade, não superior a 2 (dois) anos, pode ser suspensa, por 2 (dois) anos a 6 (seis) anos, desde que:

I - o sentenciado não haja sofrido no País ou no estrangeiro, condenação irrecorrível por outro crime a pena privativa da liberdade, salvo o disposto no 1º do art. 71;

II - os seus antecedentes e personalidade, os motivos e as circunstâncias do crime, bem como sua conduta posterior, autorizem a presunção de que não tornará a delinquir.

Restrições

Parágrafo único. A suspensão não se estende às penas de reforma, suspensão do exercício do posto, graduação ou função ou à pena acessória, nem exclui a aplicação de medida de segurança não detentiva.

 

Mirabete1 fez o seguinte comentário ao sursis:

 

Permite a lei que não se execute a pena privativa de liberdade ao condenado que preencha os requisitos exigidos para a concessão do sursis, ficando o condenado sujeito a algumas condições impostas na lei ou pelo juiz, durante prazo determinado, e que, se não cumpridas, podem dar causa à revogação do benefício. É a suspensão condicional da pena que pela lei não é mais considerada incidente da execução, mas forma de cumprimento de pena. Além disso, considera-se que o sursis é um direito subjetivo do acusado que preencher os requisitos exigidos, e não mera faculdade do juiz.

 

Primeiro questionamento: é um direito do condenado? Sim, é um direito subjetivo2, ou seja, caberá ao Conselho de Justiça (Especial ou Permanente) ou ao STM, verificando as condições do caso concreto frente aos pressupostos legais penais, deferir ou indeferir o benefício.

E como dito por Mirabete, tal concessão não é mera faculdade do juiz, pois se presentes os pressupostos previstos na lei, o sursis3 deverá ser concedido.

O indeferimento do sursis poderá ser questionado via habeas corpus, conforme consignado em antiga decisão do STF:

 

HABEAS CORPUS". "SURSIS". Condenação pela Justiça Militar a pena de oito meses de detenção. Réu primário e de bons antecedentes, sendo que as circunstâncias do crime não levam a entender-se que o paciente torne a prática de novos ilícitos penais. Precedente no HC 63.038-SP. "Habeas Corpus" deferido, para conceder ao paciente o "sursis", devendo o Juiz-Auditor competente estabelecer as condições específicas de gozo de benefício. (STF - HC nº 68.708 - Tribunal Pleno - Relator Ministro Néri da Silveira - DJ de 22.11.1991)

 

A ficha disciplinar4 do militar pode ser levada em consideração para efeito de concessão do sursis pela Justiça Militar, conforme já decidido pelo STF:

 

HABEAS CORPUS. CRIME MILITAR DE ABANDONO DE POSTO. PENA DE 03 MESES E 20 DIAS DE RECLUSÃO. PRETENDIDO DIREITO SUBJETIVO AO SURSIS DA PENA. Não há direito subjetivo do acusado ao benefício da suspensão condicional da pena (art. 77 do CP), sendo legítima a decisão que indefere este benefício com apoio no elevado número de punições disciplinares já aplicadas ao paciente. Ordem denegada. (STF - HC nº 85790 – 1ª Turma – Relator Ministro Carlos Britto - DJ de 12.05.2006)

 

É obrigatório que na sentença penal conste o pronunciamento judicial sobre a concessão do benefício, sob pena de nulidade5 nesta parte, haja vista a previsão contida no art. 607 do CPPM:

 

Art. 607. O Conselho de Justiça, o Auditor ou o Tribunal, na decisão que aplicar pena privativa da liberdade não superior a 2 (dois) anos, deverão pronunciar-se, motivadamente, sobre a suspensão condicional, quer a concedam, quer a deneguem.

 

Segundo questionamento: é possível a concessão do sursis em qualquer crime militar? Não. Há proibição6 do deferimento do sursis nos crimes cometidos em tempo de guerra e em vários crimes cometidos em tempo de paz, conforme previsão explícita do art. 88 do CPM:

 

Não aplicação da suspensão condicional da pena

Art. 88. A suspensão condicional da pena não se aplica:

I - ao condenado por crime cometido em tempo de guerra;

II - em tempo de paz:

a) por crime contra a segurança nacional, de aliciação e incitamento, de violência contra superior, oficial de dia, de serviço ou de quarto, sentinela, vigia ou plantão, de desrespeito a superior, de insubordinação, ou de deserção;

b) pelos crimes previstos nos arts. 160, 161, 162, 235, 291 e seu parágrafo único, ns. I a IV.

 

Então, vejamos quais são os delitos insusceptíveis do benefício do sursis: a) qualquer delito penal militar cometido em tempo de guerra; b) crime contra a segurança nacional (Lei 7.170/83); c) de aliciação e incitamento (CPM 154 a 156); d) de violência contra superior, oficial de dia, de serviço ou de quarto, sentinela, vigia ou plantão (CPM 157 a 159); e) de desrespeito a superior (CPM 160); f) de insubordinação (CPM 163 a 166); g) de deserção7 (CPM 187 a 194); h) desrespeito a símbolo nacional (CPM 161); i) despojamento desprezível (CPM 162); j) pederastia ou outro ato de libidinagem (CPM 235); e l) receita ilegal (CPM 291).

Quanto ao delito de deserção, o STM passou a entender que é possível a concessão do sursis quando o militar vier a ser licenciado do serviço ativo:

 

APELAÇÃO. CRIME DE DESERÇÃO. PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO. REJEIÇÃO. UNANIMIDADE. PRELIMINAR DE PERDA DA CONDIÇÃO DE PROSSEGUIBILIDADE. REJEIÇÃO. MAIORIA. MÉRITO. CONCESSÃO DO SURSIS. APELO PROVIDO. UNÂNIME. Mesmo considerando a menoridade relativa do Apelante, inexiste lapso temporal superior a um ano entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença condenatória. A perda do status de militar posterior à instauração da ação penal por crime de deserção não possui o condão de extinguir o processo. A condição de militar deve prevalecer tão somente para fins de deflagração da ação penal, ou seja, até o recebimento da denúncia. O entendimento prevalente nesta Corte é pelo descabimento da concessão do sursis, diante da imprescindível necessidade de maior rigor na punição de tal conduta, além da expressa vedação legal, nos termos do art. 88, inciso II, alínea "a", do CPM, e do art. 617 do CPPM. Entretanto, ressalve-se apenas que o Tribunal tem admitido a concessão do benefício, acertadamente, por questão de política criminal, ao autor do crime de deserção que vier a ser licenciado do serviço militar e readquirir a condição de civil. Preliminares rejeitadas. No mérito, apelo provido por unanimidade. (STM – Apelação nº 7000133-66.2019.7.00.0000 - Relator Ministro William de Oliveira Barros - DJe de 21.08.2019)

 

O STF entende que a previsão contida no inciso II do art. 88 do CPM referente à proibição da concessão do sursis em determinados crimes militares em tempo de paz é constitucional:

 

1. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. 2. Crime militar. Violência contra superior e lesão corporal leve (arts. 157, § 3º, e 209 do CPM). 3. Alegação de inconstitucionalidade do art. 88, inciso II, do CPM e do art. 617, inciso II, do CPPM, que preveem a vedação da concessão de sursis a determinados crimes militares cometidos em tempo de paz. O Plenário já decidiu pela constitucionalidade de norma que veda, especificamente, a militares benefícios penais. 4. Pendência de julgamento do HC 113.857, de relatoria do Min. Dias Toffoli. Não havendo decisão suspendendo os efeitos do referido dispositivo legal, presume-se ser este constitucional até o julgamento do referido habeas corpus. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - RE nº 758084 – 2ª Turma – Relator Ministro Gilmar Mendes – DJe de 04.11.2013)

 

Ou seja, em caso de condenação por um desses crimes militares, em regra, não será deferida a concessão do sursis, assim, haverá a execução8 da pena restritiva de liberdade, embora a pena seja igual ou inferior a 2 (dois) anos.

Em relação aos crimes contra a segurança nacional, o STF e o STM firmaram entendimento de que não cabe mais à Justiça Militar a competência para processar e julgar tais delitos penais, haja vista não serem da competência dessa justiça especializada desde a promulgação da CF/88:

 

CRIME POLÍTICO. COMPETÊNCIA. INTRODUÇÃO, NO TERRITÓRIO NACIONAL, DE MUNIÇÃO PRIVATIVA DAS FORÇAS ARMADAS, PRATICADO POR MILITAR DA RESERVA (ARTIGO 12 DA LSN). INEXISTÊNCIA DE MOTIVAÇÃO POLÍTICA: CRIME COMUM. PRELIMINARES DE COMPETÊNCIA: 1ª) Os juízes federais são competentes para processar e julgar os crimes políticos e o Supremo Tribunal Federal para julgar os mesmos crimes em segundo grau de jurisdição (CF, artigos 109, IV , e 102, II, b), a despeito do que dispõem os artigos 23, IV, e 6º, III, c, do Regimento Interno, cujas disposições não mais estão previstas na Constituição. 2ª) Incompetência da Justiça Militar: a Carta de 1969 dava competência à Justiça Militar para julgar os crimes contra a segurança nacional (artigo 129 e seu § 1º); entretanto, a Constituição de 1988, substituindo tal denominação pela de crime político, retirou-lhe esta competência (artigo 124 e seu par. único), outorgando-a à Justiça Federal (artigo 109, IV). 3ª) Se o paciente foi julgado por crime político em primeira instância , esta Corte é competente para o exame da apelação, ainda que reconheça inaplicável a Lei de Segurança Nacional. MÉRITO: 1. Como a Constituição não define crime político, cabe ao intérprete fazê-lo diante do caso concreto e da lei vigente. 2. Só há crime político quando presentes os pressupostos do artigo 2º da Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/82), ao qual se integram os do artigo 1º: a materialidade da conduta deve lesar real ou potencialmente ou expor a perigo de lesão a soberania nacional, de forma que, ainda que a conduta esteja tipificada no artigo 12 da LSN, é preciso que se lhe agregue a motivação política. Precedentes. 3. Recurso conhecido e provido, em parte, por seis votos contra cinco, para, assentada a natureza comum do crime, anular a sentença e determinar que outra seja prolatada, observado o Código Penal. (STF - RC nº 1468 – Pleno – Relator Ministro Ilmar Galvão - DJ de 16.08.2000)

 

RECURSO INOMINADO. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. MANTER EM DEPÓSITO ARMAMENTO OU MATERIAL MILITAR PRIVATIVO DAS FORÇAS ARMADAS. CRIME POLÍTICO PRATICADO POR CIVIL. ARTIGO 12, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI DE SEGURANÇA NACIONAL. EXISTÊNCIA DE DECISÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PELA COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA MILITAR. PRETENSÃO MINISTERIAL NO SENTIDO DE QUE O SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR SUSCITE O CONFLITO DE JURISDIÇÃO PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (ART. 102, INCISO I, ALÍNEA "O", DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CONJUGADO AO ART. 102 DO RISTM). I - Conflito de competência que tem origem em decisões monocráticas antagônicas, proferidas por Ministro do Superior Tribunal de Justiça e Juíza-Auditora da Auditoria da 4ª CJM, acerca da competência para processar e julgar membros de quadrilha de traficantes pela prática do crime capitulado no parágrafo único do art. 12 da Lei de Segurança Nacional; II - Falece atribuição constitucional ao Ministério Público Militar para o oferecimento de denúncia por crime capitulado na Lei 7.170/83 - Lei de Segurança Nacional; III - A Lei de Segurança Nacional, em seus artigos 1º e 2º adota, respectivamente, a teoria objetiva e subjetiva de proteção ao bem jurídico tutelado. Desse modo, todos os tipos penais descritos na Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7.170/83) são crimes políticos objetivamente considerados e devem ser processados e julgados perante a Justiça Federal, ex vi do art. 109, IV, da Carta Magna; IV - As Constituições brasileiras sempre delegaram à Justiça Federal, seja a Comum, seja a Militar, competência para julgar os crimes políticos, sendo que a Constituição Federal de 1988, ao tratar da competência da Justiça Militar (art. 124), a restringiu para o processamento e julgamento dos crimes militares definidos em lei. Tais crimes têm definição no art. 9º do Código Penal Militar, que não inclui os crimes contra a segurança nacional. Via de conclusão, o art. 30 da Lei de Segurança Nacional não foi recepcionado pela nova ordem constitucional; V - Recurso inominado recebido como Conflito Negativo de Competência e encaminhado ao Presidente deste Superior Tribunal Militar para a remessa dos autos ao Egrégio Supremo Tribunal Federal, a quem cabe dirimir a quaestio. Decisão por maioria. (STM – Conflito de Competência nº 2004.02.000316-1/DF - Relator Ministro José Coêlho Ferreira - DJ de 08.11.2004)

 

O art. 3939 do CPPM prevê que o Oficial que estiver sendo processado ou sujeito a IPM não poderá ser transferido para reserva:

 

Proibição de transferência para a reserva

Art. 393. O oficial processado, ou sujeito a inquérito policial militar, não poderá ser transferido para a reserva, salvo se atingir a idade-limite de permanência no serviço ativo.

 

Entendo que esse dispositivo processual penal castrense está revogado tacitamente em virtude de que a Lei nº 13.954/2019 revogou o § 4º do art. 97 da Lei nº 6.880/1980, que assim prescrevia:

 

§ 4º Não será concedida transferência para a reserva remunerada, a pedido, ao militar que:

a) estiver respondendo a inquérito ou processo em qualquer jurisdição; e

b) estiver cumprindo pena de qualquer natureza.

 

É necessário, agora, tratar sobre o impedimento10 de acesso na hierarquia militar, mediante promoção, quando o militar está sub judice, que é o caso de quando está cumprindo o sursis. Há legislações castrenses que não permitem a promoção do militar quando, por exemplo, estiver sendo processado pela Justiça Militar da União ou Comum, além de outros casos previstos nas normas específicas.

A alínea g do art. 35 da Lei nº 5.821/1972 (Dispõe sobre as promoções dos Oficiais da ativa das Forças Armadas e dá outras providências) prevê que o Oficial não poderá constar de qualquer Quadro de Acesso e Lista de Escolha quando estiver em sursis:

 

Art. 35. O oficial não poderá constar de qualquer Quadro de Acesso e Lista de Escolha quando:

a) deixar de satisfazer as condições estabelecidas na letra a do artigo 15;

b) for considerado não habilitado para o acesso, em caráter provisório, a juízo do Almirantado, do Alto Comando ou da Comissão de Promoções, por, presumivelmente, ser incapaz de atender a quaisquer dos requisitos estabelecidos nas alíneas “b” e “c” do caput do art. 15 desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

c) for preso cautelarmente, enquanto a prisão não for revogada; (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

d) for réu em ação penal por crime doloso, enquanto a sentença final não houver transitado em julgado; (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

e) estiver submetido a Conselho de Justificação, instaurado " ex officio ";

f) (revogada); (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

g) for condenado, enquanto durar o cumprimento da pena, inclusive no caso de suspensão condicional da pena, não se computando o tempo acrescido à pena original para fins de sua suspensão condicional;

h) for licenciado para tratar de interesse particular;

i) for condenado à pena de suspensão do exercício do posto, cargo ou função prevista no Código Penal Militar, durante o prazo dessa suspensão;

(…)

 

O inciso VII do art. 36 do Decreto nº 4.034/2001 (Promoção de Praças da Marinha) prevê que a Praça não poderá constar de qualquer Quadro de Acesso quando estiver no sursis:

 

Art. 36. A praça não poderá constar de qualquer Quadro de Acesso quando:

I - deixar de satisfazer as condições estabelecidas no inciso I do art. 15 deste Decreto;

II - for considerada não habilitada para o acesso, em caráter provisório, a juízo da CPP, por presumivelmente, ser incapaz de atender aos requisitos estabelecidos nos incisos II e III do art. 15 deste Decreto;

III - for presa preventivamente ou em flagrante delito, enquanto a prisão não for revogada;

IV - estiver "sub judice", por recebimento de denúncia e consequente citação em processo crime, enquanto a sentença final não houver transitado em julgado;

V - estiver submetida a Conselho de Disciplina instaurado;

VI - for presa preventivamente, em virtude de Inquérito Policial Militar instaurado, ou de processo criminal;

VII - for condenada, enquanto durar o cumprimento da pena, inclusive no caso de suspensão condicional da pena, não se computando o tempo acrescido à pena original para fins de sua suspensão condicional;

VIII - for licenciada para tratar de interesse particular ou para acompanhar cônjuge;

IX - for condenada à pena de suspensão do exercício da graduação, cargo ou função prevista no Código Penal Militar, durante o prazo desta suspensão;

X - estiver em dívida com a Fazenda Nacional, por alcance;

XI - for considerada prisioneira de guerra;

XII - for considerada desaparecida;

XIII - for considerada extraviada;

XIV - for considerada desertora; ou

XV - com mais de dez anos de serviço, se candidatar a cargo eletivo.

 

A alínea h do inciso II do art. 17 do Decreto nº 4.853/2003 (Promoção de Graduados do Exército) também possui esse tipo de restrição:

 

Art. 17. Em cada graduação, para o ingresso em QA, é necessário que o graduado:

I - satisfaça aos seguintes requisitos essenciais:

a) interstício;

b) arregimentação;

c) aptidão física;

d) aproveitamento em curso ou concurso de habilitação ao desempenho dos cargos próprios da graduação superior; e

e) classificação, no mínimo, no comportamento militar "bom";

II - não incida em qualquer das seguintes situações impeditivas:

a) atingir, até a data das promoções, a idade limite para permanência no serviço ativo;

b) encontrar-se respondendo a processo criminal, em decorrência de recebimento de denúncia, enquanto a sentença final não houver transitado em julgado;

c) estar preso preventivamente, em virtude de inquérito policial militar instaurado;

d) estar submetido a conselho de disciplina, instaurado ex officio;

e) estar preso, preventivamente ou em flagrante delito;

f) estar em dívida com a União, por alcance;

g) estar sofrendo pena de suspensão do exercício da graduação, cargo ou função, prevista no Código Penal Militar;

h) estar sofrendo pena privativa de liberdade, por sentença transitada em julgado, mesmo quando beneficiado por livramento condicional ou suspensão condicional da pena;

i) estar sofrendo pena restritiva de direito, por sentença transitada em julgado;

(...)

 

A lei e os decretos acima citados, quanto ao assunto promoção, são unânimes ao prever o impedimento ao Quadro de Acesso e à Lista de Escolha para os militares, sejam Oficiais ou Praças, que estejam sendo processados na esfera penal (processo-crime) enquanto não transitada em julgado a sentença final. Ou seja, em havendo recursos pendentes (ex.: apelação criminal), mesmo que o militar tenha sido absolvido na primeira instância, não será possível a ascensão do militar sub judice na carreira militar.

Quanto à transferência11 (movimentação) de localidade, em regra, não há nenhum empecilho legal, todavia, é prudente o prévio questionamento ao Juízo de Execuções da respectiva Auditoria Militar, haja vista que o militar sujeito ao sursis está sob vigilância (cumprindo pena, porém, em liberdade) da Justiça Militar.

O art. 392 do CPPM proíbe, salvo exceções, a transferência12 ou remoção do militar acusado13 enquanto não proferida decisão final no processo criminal, mas não faz nenhuma referência quando o militar condenado estiver cumprindo o sursis14:

 

Proibição de transferência ou remoção

Art. 392. O acusado ficará à disposição exclusiva da Justiça Militar, não podendo ser transferido ou removido para fora da sede da Auditoria, até a sentença final, salvo motivo relevante que será apreciado pelo auditor, após comunicação da autoridade militar, ou a requerimento do acusado, se civil.

 

Aproveito e informo que os militares temporários poderão ser licenciados ainda que estejam sendo processados criminalmente, conforme entendimento do STM:

 

MANDADO DE SEGURANÇA. Licenciamento de praças. - A vedação legal para o licenciamento de praças sub judice aplica-se exclusivamente àquelas em prestação do serviço militar inicial. - Hipótese em que se cuida de praças reengajadas e sem estabilidade, com tempo de serviço do último reengajamento já esgotado, o que faz legalmente possível o licenciamento diante das fundadas razões expostas pela Administração Militar. - Concessão da Segurança, para cassar a Decisão do CPJ que determinou a permanência dos Sgts. MILTON JARDIM ROSBAQUE e JOVELINO MARQUES DOS SANTOS no Serviço Ativo do Exército. - Unânime. (STM – Mandado de Segurança nº 2000.01.000554-4/DF – Relator Ministro José Enaldo Rodrigues - DJ de 11.05.2000)

 

MANDADO DE SEGURANÇA. Preliminar. Unificação de julgamento não prevista no RISTM. Cabimento do "madamus" contra ato judicial contestado, tido como violador de "direito líquido e certo". Competência regida pela disposição ínsita no Art. 6º, I, "d", da Lei nº 8.457/92. Competência do Juiz-Auditor para decidir monocraticamente quando o fato é totalmente desvinculado de matéria processual penal militar. Mérito: licenciamento de oficial temporário. Inexiste direito líquido e certo de prorrogação de permanência no serviço ativo se o Comandante decide pelo seu licenciamento, por conveniência do serviço. Precedentes da Corte no sentido de que o licenciamento de Oficiais R2 em nada contraria o dispositivo do Art. 393 do CPPM. Preliminar rejeitada. No mérito, conhecido o "mandamus" e indeferida a segurança, por falta de amparo legal. Decisão unânime. (STM – Mandado de Segurança nº 2000.01.000572-2/PE – Relator Ministro Germano Arnoldi - DJ de 21.02.2001)

 

Entretanto, o STM passou a entender que, em relação ao desertor, é necessário que esteja no serviço ativo para ser possível o início da ação penal com o recebimento da denúncia, sendo que, após, poderá ser licenciado com a continuidade normal do processo criminal:

 

APELAÇÃO. MPM. SUPERVENIENTE LICENCIAMENTO DE MILITAR. AUSÊNCIA DE ÓBICE PARA O PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO. EXIGÊNCIA LEGAL DO STATUS DE MILITAR PARA INICIAR O PROCESSO (ART. 457, § 2º, DO CPPM). TEORIA DA ATIVIDADE. PROVIMENTO. MAIORIA. Nos delitos de deserção, exige-se a condição de militar apenas para a instauração da ação penal. O licenciamento do acusado das fileiras da Força não obstaculiza o curso do processo de rito especial. Segundo a teoria da atividade, adotada pelo Código Penal Militar, em seu art. 5º, "considera- se praticado o crime no momento da ação ou da omissão, ainda que outro seja o do resultado". À luz do art. 457, § 2º, do CPPM, uma vez atendido o requisito da legitimidade passiva, torna-se inviável frustrar o curso da ação penal pelo advento do status de civil do acusado. Apelação provida. Decisão majoritária. (STM – Apelação nº 7001476-97.2019.7.00.0000 – Relator Ministro William de Oliveira Barros – DJe de 16.09.2020)

 

O STM possui uma súmula sobre sursis:

 

SÚMULA Nº 1615: A suspensão condicional da pena (sursis) não é espécie de pena; portanto, o transcurso do período de prova, estabelecido em audiência admonitória, não atende ao requisito objetivo exigível para a declaração de extinção da punibilidade pelo indulto.

 

Finalizando esse subtópico, referente ao sursis16, conclui-se que a suspensão condicional da pena é um direito subjetivo do condenado e que não é aplicável a todos os tipos penais militares.

__________________________

1MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código Penal Interpretado. 1ª ed. São Paulo: Editora Atlas, 1999. p. 425.

2CRIMINAL. HC. CRIME MILITAR. PREVARICAÇÃO. APLICAÇÃO DA LEI N.º 9.714/98 AOS CRIMES CASTRENSES. IMPOSSIBILIDADE. OMISSÃO QUANTO À POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DO BENEFÍCIO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA. PRESSUPOSTO SUBJETIVO. IMPROPRIEDADE DO MEIO ELEITO. DIREITO SUBJETIVO DOS RÉUS. TEMA DE APRECIAÇÃO OBRIGATÓRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. I. A Lei n.º 9.714/98 foi explícita ao regular apenas as modificações de institutos disciplinados no Código Penal, não sendo possível sua extensão para abranger as disposições constantes do Código Penal Militar. Precedentes do STJ e do STF. II. Os crimes militares são disciplinados pela lei especial, sendo aplicável o Código Penal apenas quando expressa a determinação de emprego da norma geral, nos casos de omissão da lei castrense. III. Não cabe o exame dos pressupostos subjetivos indispensáveis à concessão da suspensão condicional da pena, tendo em vista a impropriedade do meio eleito, o qual veda o reexame do material cognitivo. IV. Tendo sido a reprimenda imposta abaixo do limite de 02 anos e não sendo o caso de pena de reforma, suspensão do exercício do posto, graduação ou função ou, ainda, acessória, é direito subjetivo do réu ver a possibilidade da suspensão condicional da pena ser apreciada pelo Juízo que o condenou. V. Deve ser determinado que o Magistrado singular aprecie a possibilidade de deferimento da suspensão condicional da pena imposta aos pacientes. VI. Ordem parcialmente concedida, nos termos do voto do Relator. (STJ - HC nº 42.860/RJ – 5ª Turma - Relator Ministro Gilson Dipp - DJ de 01.08.2005)

3EMBARGOS INFRINGENTES. MPM. SUSPENSÃO CONDICIONAL DA PENA. PERÍODO DE PROVA. REVOGAÇÃO. ART. 86 DO CPM. ART. 614 DO CPPM. REJEIÇÃO. MAIORIA. I - O período de prova do sursis deve ser supervisionado pelo Ministério Público Militar durante sua realização. II - Eventual prorrogação ou revogação do benefício deve ocorrer antes do término de seu prazo de cumprimento. III - Caso ultrapassado o período de prova sem a revogação ou a prorrogação do sursis, opera-se a extinção da pena privativa de liberdade, por não ser possível prorrogar um prazo que já se encontra extinto. Embargos Infringentes rejeitados. Decisão majoritária. (STM – Embargos Infringentes nº 7001144-33.2019.7.00.0000 – Relator Ministro José Coêlho Ferreira - DJe de 04.06.2020)

4EMBARGOS DA DEFESA. FURTO. MAUS ANTECEDENTES. NEGATIVA DO "SURSIS". Embargos acolhidos. Crime de furto caracterizado, bem como comprovadas autoria, materialidade e culpabilidade. Agente punido com diversas punições disciplinares e respondendo a outros processos na Justiça Militar, o que inviabiliza a concessão da suspensão condicional da pena. O "quantum" da atenuação, guardada a legalidade entre o mínimo e o máximo, encontra-se no campo discricionário do julgador e coaduna-se com a exigência de proporcionalidade da resposta estatal à prática de um delito, que neste caso, foi praticado sem violência e desprovido de maiores consequências para o ofendido. Embargos acolhidos para, reformando o acórdão atacado, reduzir a pena a 04 meses de prisão, a ser cumprida inicialmente em regime aberto, mantendo a não concessão do "sursis". Decisão majoritária. (STM – Embargos nº 2002.01.048925-1/AM - Relator Ministro Antônio Carlos de Nogueira – DJ de 02.04.2003)

5Pode ser arguida preliminar de nulidade na Apelação Criminal ou, se for o caso, impetrado habeas corpus, onde, sendo acatada a nulidade, o Tribunal (STM ou STF), mandará que os autos retornem ao Juízo competente para analisar a concessão do sursis. Esclareça-se que não são cabíveis Embargos de Declaração em primeira instância na Justiça Militar, pois o art. 510 não faz tal menção, conforme já, inclusive, acordado pelo STM:

VIOLÊNCIA CONTRA INFERIOR E LESÕES CORPORAIS. Período de instrução. Embargos em Sentença de 1º grau. Procrastinação do feito. Preliminar Intempestividade do Apelo Militar condenado por agressão e lesão corporal contra inferior, durante instrução criminal, apela alegando falta de prova. Advogado constituído Apelo considerado intempestivo, haja vista o descabimento de embargos de declaração em Sentença de primeiro grau, atinentes a feitos da competência de Justiça Militar da União. Ausência de previsão legal. Acolhida preliminar de intempestividade. Apelo não-conhecido. Decisão unânime. (STM – Apelação Criminal nº 2004.01.049565-7/BA – Relator Ministro Marcos Augusto Leal de Azevedo - DJ de 17.05.2006)

Todavia, entendo, particularmente, que não há nenhum problema em que sejam aceitos embargos declaratórios contra sentença de primeira instância da Justiça Militar, porém, é o entendimento jurisprudencial pacificado na Justiça Militar da União. No excelente livro de Autoria dos Drs. Cláudio Amin Miguel (Juiz Militar da 6ª Auditoria Militar do Rio de Janeiro) e Nelson Coldibelli (Elementos de Direito Processual Penal Militar – 3ª Edição – Livraria e Editora Lumen Juris – pág. 192/193), que aconselho a leitura de todos os Advogados militantes da área penal militar, consta o seguinte comentário sobre embargos declaratórios: “Das decisões do Juízo de primeira instância, cabem apenas, segundo o disposto no artigo acima citado, os recursos de apelação e em sentido estrito. No entanto, arriscamo-nos a afirmar que nada impede a interposição de embargos de declaração quando for obscura, contraditória ou omissa, apesar de o artigo 542 do CPPM só admiti-los contra acórdãos do Supremo Tribunal Militar. Não verificamos qualquer prejuízo para as partes ou mesmo para o processo, admitir os embargos em primeira instância; ao contrário, estaria sendo respeitado o princípio da celeridade processual, porque se evitaria a interposição, por exemplo, de apelação, apenas para tornar clara a decisão, quando o próprio Juiz-Auditor ou o Conselho de Justiça poderiam corrigir o vício. Vale lembrar que, expressamente, em primeira instância, o CPPM somente admite embargos nas hipóteses previstas nos artigos 203 e 219. São os chamados “embarguinhos”. Acrescente-se, ainda, a possibilidade de interposição de recursos inominados, previstos em diversos dispositivos do CPPM, verbi gratia artigos 145 e 146.”

Eu sugiro que em sendo opostos (por tentativa) embargos de declaração em primeira instância, não se deixe esgotar o prazo para interposição da apelação criminal, pois como demonstrado na ementa acima transcrita do STM, foi considerado intempestivo o recurso criminal. No processo penal comum, os embargos declaratórios em primeira instância suspendem o prazo para a interposição de recurso, entretanto, se o STM, assim como nessa ementa, mantiver o entendimento de não cabimento de embargos, poderá considerar preclusa a apelação criminal.

6APELAÇÃO. DESERÇÃO. O art. 88, inciso II, alínea "a", do CPM é taxativo quanto ao impedimento da concessão do benefício do sursis em se tratando de crime de deserção. Da mesma forma dispõe o art. 617, inciso II, alínea a, do CPPM. Na Exposição de Motivos do vigente Código Penal Militar, em seu item 9, bem como na Exposição de Motivos do Código Processual Penal Militar, no item 22, respectivamente, o legislador, deliberadamente, não permitiu sua aplicação. O objetivo do texto normativo é fazer com que prevaleçam os princípios da hierarquia e disciplina entre os militares, e implica por si mesmo na compreensão do que impede a concessão do sursis aos ilícitos que significam a quebra desses princípios, basilares das Forças Armadas, por condutas tais como a deserção ou a insubordinação. No mérito, o Acusado recebeu instrução sobre Justiça e Disciplina, especificamente, sobre as transgressões disciplinares, crimes militares e suas consequências. Ademais, após ter se ausentado da OM, recebeu mensagens via Orkut do colega que o informava de que ele estava prestes a cometer um crime militar. Autoria e materialidade comprovadas. Ausência de excludentes de culpa ou de crime. Rejeitada a preliminar defensiva e desprovido o recurso. Maioria. (STM – Apelação Criminal nº 0000018-39.2011.7.10.0010/CE – Relatora Ministra Maria Elizabeth Guimarães Teixeira Rocha – DJe de 11.06.2013)

7No subtópico nº 19.12.1 deste Capítulo tem mais comentários sobre a proibição do sursis na deserção, onde cito, inclusive, uma decisão do STF do ano de 2013, onde houve empate entre os Ministros quanto à possibilidade da concessão do sursis nesse tipo penal.

8O militar condenado será preso para cumprir a pena condenatória.

9Em julgamento proferido no ano de 1995 (Correição Parcial nº 1995.01.001462-7), o STM entendeu que esse dispositivo estava em vigor e que somente se referia ao Oficial de carreira.

10Não poderá constar no Quadro de Acesso e nem nas Listas de Escolha.

11CORREIÇÃO PARCIAL - EXECUÇÃO PROVISÓRIA - PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA. Pleito correicional requerido pelo MPM, visando desconstituir a autorização judicial que permitiu ao jurisdicionado, cujo processo encontra-se em grau de recurso, requerer, administrativamente, transferência, por motivo particular, para cidade de outra Circunscrição Judiciária Militar. Matéria inerente à execução de sentença, embora provisória, vincula-se à competência originária do Juízo de primeira Instância (grifo meu), a teor do inciso XI, do art. 30, da Lei nº 8.457/92, e art. 588 do CPPM. Configurado que o Magistrado a quo, ao atender ao requerido, atuou dentro de sua competência jurisdicional. Correição Parcial indeferida. Decisão unânime. (STM – Correição Parcial nº 2003.01.001866-5 – Relator Ministro Marcus Herndl - DJ de 26.11.2003)

12A Justiça Militar da União costuma permitir a movimentação, principalmente, nos dias de hoje onde é possível audiências por videoconferência, que já ocorria, regularmente, mesmo antes da pandemia do COVID19.

13Acusado é aquele que está sendo processado judicialmente a partir do momento do recebimento da denúncia pelo magistrado. Esclareça-se que os Conselhos de Justiça não detém competência para o recebimento de denúncia.

14Meus clientes que estão no sursis não tiveram problemas nas movimentações de localidades.

15(DJe n° 207, de 11.11.2016)

16Em regra, o condenado, durante o período do sursis, deverá comparecer à Auditoria Militar respectiva a cada 2 (dois) ou 3 (três) meses, a fim de assinar documento que fará parte do processo de execução penal. Quando o militar serve em outro Estado, que não a sede da Auditoria, costuma-se realizar esses comparecimentos via carta precatória criminal, seja em outra Auditoria Militar, ou mesmo no Juízo Federal ou Estadual, dependendo da localidade. Após terminado o prazo do sursis, o Juiz deprecado (da localidade onde o militar de apresentou bimestralmente ou trimestralmente) enviará os autos deprecados à Auditoria responsável, a fim de que o Juiz, verificando o cumprimento do sursis, declare extinta (cumprida) a pena, donde o militar deixará de ser considerado sub judice para a Administração Castrense. Atualmente, em virtude da pandemia do COVID19, essas apresentações estão sendo feitos por e-mail para a auditoria militar.

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