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CAPÍTULO 19 - EFEITOS JURÍDICOS DA CONDENAÇÃO PENAL NA JUSTIÇA MILITAR

19. INTRODUÇÃO

 

Esse tema é muito importante e de grande desconhecimento pela quase totalidade dos militares e, também, de muitos Advogados que não praticam a Advocacia Militar Criminal, haja vista que há grandes distinções entre o processo penal militar e o processo penal comum e, sobretudo, muitas peculiaridades nos regimes jurídicos únicos dos militares das Forças Armadas e Auxiliares.

Devido ao fato de que exerço, também, a Advocacia na Justiça Militar da União, percebi que os militares desconhecem a gravidade do cometimento de um crime militar, e por isso entendi viável, desde a 1ª edição de 2009, fazer alguns esclarecimentos neste livro.

Desde já, menciono que não existe no CPM a substituição1 da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direito, está prevista nos arts. 43 e 44 do CP.

Também não existe na legislação processual penal militar a previsão legal de progressão2 de regime prisional, posto que o regime de cumprimento da pena é um só: fechado. Todavia, o STF já se pronunciou a favor da aplicação dos regimes semiaberto e aberto3 para condenados que mantiverem a condição de militares quando a pena for cumprida em estabelecimentos militares, conforme será estudado no decorrer deste Capítulo, tendo a Justiça Militar passado, consequentemente, a permitir a progressão de regime4, conforme se verifica nos autos do Agravo em Execução nº 7001362-61.2019.7.00.0000 do STM, estando sua ementa transcrita no subtópico nº 19.9 deste Capítulo.

Já foi visto no Capítulo 3 as peculiaridades dos procedimentos do APF e IPM que poderão resultar numa Ação Penal Militar, logo, neste capítulo, serão explanados alguns efeitos jurídicos de natureza penal e administrativa decorrentes da condenação penal de um militar5 pela Justiça Militar.

Não me aprofundarei em todas os dispositivos normativos contidos no CPM, CPPM e na Lei nº 6.880/1980, restringindo-me àquelas relacionadas aos efeitos jurídicos da condenação penal, e aproveito para sugerir a leitura dos livros do Promotor de Justiça Militar aposentado Jorge Cesar de Assis sobre CPM e CPPM, e quanto à Lei nº 6.880/1980, sugiro a leitura do meu livro Comentários ao Estatuto dos Militares.

Em virtude de que minha atuação profissional é mais direcionada aos militares das Forças Armadas, minhas explanações técnicas estarão mais vinculadas aos efeitos jurídicos da condenação penal na Justiça Militar da União, especialmente em relação à legislação administrativa castrense aplicável às Forças Armadas, todavia, os demais militares das Forças Auxiliares poderão se beneficiar com esses ensinamentos e fazer as devidas adequações com as respectivas legislações castrenses estadual e distrital.

Entendi cabível, também, fazer alguns esclarecimentos sobre 02 (dois) delitos penais propriamente6 militares que, não raro, são desconhecidos da maioria dos militares: deserção7 (art. 187 do CPM) e abandono de posto (art. 195 do CPM). As informações a serem discorridas sobre esses delitos poderão servir para prevenir futuras e graves consequências penais e administrativas à carreira do militar.

Ao final deste Capítulo, os leitores concluirão a imensa rigorosidade8 do CPM, do CPPM e da Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares das Forças Armadas).

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1APELAÇÃO. DEFESA. PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. REJEIÇÃO. DECISÃO UNÂNIME. ARTS. 315 E 311 AMBOS DO CPM. ALEGAÇÃO DE CRIME IMPOSSÍVEL. FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA. NÃO CONSIDERAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITOS. INAPLICABILIDADE. DECISÃO UNÂNIME. I - O princípio da identidade física do juiz não é absoluto, podendo ser flexibilizado, dependendo do contexto fático em que se encontre, a fim de garantir maior agilidade na prestação jurisdicional. Preliminar rejeitada. Decisão unânime. II - A conduta atribuída à apelante se amolda ao delito de uso de documento falso, tipificado no art. 315 do CPM, consubstanciado na apresentação de documento de título acadêmico falso para processo seletivo realizado no Exército Brasileiro. III - Não se pode considerar grosseira a falsificação que foi analisada e validada por três militares da Comissão de Recebimento do Concurso. Impossibilidade de reconhecimento da atipicidade da conduta. IV - No tocante à substituição da pena privativa de liberdade pela pena restritiva de direitos, esta Corte Castrense tem entendido pela inaplicabilidade do instituto previsto no art. 44 do Código Penal no âmbito desta Justiça Especializada. Apelo defensivo desprovido. Decisão unânime. (STM – Apelação nº 7000369-81.2020.7.00.0000 - Relator Ministro José Coêlho Ferreira – DJe de 29.01.2021)

2Será possível, entretanto, a progressão de regime quando o militar for excluído da ativa, passando a ser civil, e assim, submetendo-se à lei de execução penal comum.

3HABEAS CORPUS. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. REGIME ABERTO. EXCLUSÃO DAS FORÇAS ARMADAS. MANDADO DE PRISÃO. EXECUÇÃO PENAL. JUÍZO COMUM. 1. O regime aberto não isenta o condenado das formalidades legais, nem o coloca em situação de liberdade plena, pois contra ele pesa condenação transitada em julgado a pena restritiva de liberdade. 2. A condenação a pena restritiva de liberdade, mesmo que seja garantido o regime aberto para seu cumprimento, demanda a expedição de Mandado de Prisão, documento hábil à deflagração do processo de execução, constituindo-se em formalidade essencial, pois o apenado deve estar à disposição do Juízo de Execução competente para que sejam verificadas suas condições pessoais e as do local, a fim de que sejam estabelecidas as regras de cumprimento da pena. 3. O Mandado de Prisão e a expedição da Carta de Guia são os últimos atos afetos à Justiça Militar, sendo o recolhimento do preso o marco para o início da execução e a transferência da competência para a Justiça Estadual, nos exatos termos do art. 594 e seguintes do CPPM e do enunciado da Súmula 192 do STJ. Ordem denegada. Decisão unânime. (STM – HC nº 7000550-82.2020.7.00.0000 – Relator Ministro ARTUR VIDIGAL DE OLIVEIRA – DJe de 29.09.2020)

4AGRAVO INTERNO EM HABEAS CORPUS. DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO AO WRIT. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME E LIVRAMENTO CONDICIONAL. COMPETÊNCIA DO JUIZ DA EXECUÇÃO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. REJEIÇÃO. DECISÃO POR UNANIMIDADE. Nos termos fixados pelo CPPM e pela Lei nº 7.210/1984, a autoridade competente para decidir sobre progressão de regime de cumprimento da pena e de livramento condicional é o juiz da execução. In casu, a via estreita desse writ não permite que se proceda à análise de pedido da defesa, formulado nos autos executórios, ainda não debatido pela instância inferior, sob pena de supressão de instância. Rejeitado o recurso de agravo interno. Decisão por unanimidade. (STM – Agravo Interno no HC nº 7000498-23.2019.7.00.0000 – Relator Ministro ÁLVARO LUIZ PINTO – DJe de 31.07.2019)

5Importa mencionar que o civil, em alguns crimes (excetuando-se os crimes propriamente militares) poderá ser processado e condenado na Justiça Militar da União, todavia, os efeitos da condenação são muito diferentes dos militares.

6Quando se informa que um crime é propriamente militar, significa dizer que somente é possível de cometimento por militares e não por civis.

7Resolvi discorrer sobre a deserção em virtude de um cliente acusado de deserção (com família: esposa e filho) que sequer tinha ideia das consequências de seu ato ao deixar de cumprir seu expediente militar por mais de 8 (oito) dias sem prévia autorização de superior hierárquico.

8Vejamos a leitura da seguinte decisão do STM que considerou criminoso o ato de o militar (Oficial) não responder às perguntas de médicos militares em inspeção de saúde:

APELAÇÃO. RECURSO DO PARQUET MILICIENS. RECUSA DE OBEDIÊNCIA. OFICIAL DO EXÉRCITO BRASILEIRO. NEGATIVA DE SUBMISSÃO À INSPEÇÃO DE SAÚDE. OFENSA À AUTORIDADE MILITAR. DESCUMPRIMENTO DE DEVER IMPOSTO POR LEI. ABSOLVIÇÃO EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. SENTENÇA REFORMADA. PENA MÍNIMA. VEDAÇÃO DE SURSIS. Constitui ato de insubordinação, capitulado como crime militar de "recusa de obediência", a veemente negativa de Oficial do Exército que, instado a realizar exames periciais para fins de Conselho de Justificação e verificação da capacidade laborativa, comparece à Junta de Saúde, mas não responde aos questionamentos propostos pela equipe médica, negando-se a ser inspecionado. A quebra de obediência hierárquica que singulariza o delito de insubmissão tipificado no art. 163 do CPM torna-se inquestionável, a partir do momento em que um Oficial intermediário (Cap Ex) se recusa a executar diligência pericial ordenada por despacho emanado do Comandante do Exército, do que resulta grave abalo às estruturas das instituições militares, assentadas nos pilares da hierarquia e da disciplina. Apelo ministerial provido para reformar a sentença absolutória e impor pena, em seu grau mínimo, ao infrator da norma penal militar, sem o benefício do sursis, em face de expressa vedação contida no art. 88, inciso II, alínea "a", do CPM. Decisão por maioria. (STM – Apelação nº 0000070-42.2011.7.03.0103/RS - Relator Ministro José Américo dos Santos – DJe de 06.11.2013)

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