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CAPÍTULO 13 - CONSELHO DE DISCIPLINA: EXCLUSÃO OU REFORMA E CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS

13.1. O QUE É O CONSELHO DE DISCIPLINA?

 

O CD é o processo administrativo destinado a julgar a incapacidade1 do Guarda-Marinha, Aspirante-a-Oficial e das Praças estáveis integrantes das Forças Armadas e Forças Auxiliares para continuarem na ativa, ou quando em inatividade, a continuarem dignas de suas graduações, devido ao cometimento de faltas administrativas e outros atos previstos em normas legais, que as tornaram incompatíveis com a função militar.

Vejamos abaixo a conceituação e o propósito do CD de acordo com a DGPM-315 – 3ª revisão (Marinha):

 

4.2 - CONCEITO

O CD é um processo disciplinar de caráter administrativo, independente de ação penal, podendo, entretanto, tornar-se peça a ser utilizada na instrução de processo criminal na Justiça Militar, caso as acusações provadas e consideradas procedentes constituam ilícito penal militar. O CD é previsto no Dec nº 71.500/1972, sendo aplicadas, subsidiariamente, as disposições do Código de Processo Penal Militar (CPPM).

4.3 - PROPÓSITO

O CD é destinado a julgar a capacidade dos Guardas-Marinha e das praças com estabilidade assegurada para a permanência na ativa, como também das praças reformadas ou na reserva remunerada, presumivelmente incapazes de permanecerem na situação de inatividade em que se encontram, criando-lhes, ao mesmo tempo, condições para se defenderem.

O inciso III do art. 2º da IG-02.021 assim conceitua o CD:

 

III - Conselho de Disciplina: órgão colegiado, constituído ad hoc, para julgar, sob o aspecto ético-moral, o aspirante-a-oficial de carreira e as demais praças da ativa com estabilidade assegurada, como também o aspirante-a-oficial e demais praças da reserva remunerada ou reformados que, por sua conduta, tornem-se, em tese, incapazes de permanecer na ativa ou na inatividade, proporcionando-lhes, ao mesmo tempo, condições para se defender;

 

Os Estados e o DF possuem normas específicas sobre a submissão de seus militares ao CD2, podendo-se citar o Decreto nº 4.713/1996 (Goiás), a Lei nº 3.800/1976 (Mato Grosso), a Lei nº 6.477/1977 (Distrito Federal) e o Decreto nº 2.155/78 (Rio de Janeiro).

Devido ao fato de que a maioria das normas estaduais e distrital sobre o CD tem origem no Decreto nº 71.500/1972, analisarei somente esta norma castrense, a fim de servir como uma orientação básica para todos os demais militares.

Logo, os Policiais e Bombeiros das Forças Auxiliares deverão fazer as devidas adaptações3 à legislação do respectivo Estado ou DF.

A título de exemplo, vou transcrever as normas do CD do Paraná dispostas no Título III da Lei nº 16.544/2010:

 

TÍTULO III
DO CONSELHO DE DISCIPLINA

CAPÍTULO I

DA COMPOSIÇÃO

 

Art. 27. O Conselho de Disciplina será composto por 3 (três) membros.

§ 1º Ao membro mais antigo, no mínimo um oficial intermediário, caberá a presidência dos trabalhos e, ao mais moderno, o encargo de escrivão.

§ 2º Poderá ser nomeado, como membro do Conselho de Disciplina, subtenente ou primeiro-sargento, circunstância em que a praça exercerá o encargo de escrivão.

§ 3º O Conselho de Disciplina funcionará com a totalidade de seus membros.

 

CAPÍTULO II

DO JULGAMENTO E DO RELATÓRIO

 

Art. 28. Realizadas todas as diligências, bem como juntada aos autos a defesa final, o Conselho de Disciplina reunir-se-á para a sessão de julgamento.

§ 1º O acusado e seu defensor serão notificados, com antecedência mínima de 2 (dois) dias úteis, para comparecerem à sessão de julgamento.

§ 2º Após a deliberação acerca de todas as provas constantes dos autos, bem como análise das peças de defesa apresentadas, o Conselho de Justificação deverá julgar:

I - se é procedente a acusação, bem como se é acusado capaz de permanecer na ativa ou na situação em que se encontra na inatividade;

II - no caso do inciso V do art. 5º desta lei, levados em consideração os preceitos da aplicação da pena, se é o acusado capaz de permanecer na ativa ou na situação em que se encontra na inatividade.

§ 3º A decisão do Conselho de Justificação é tomada por maioria de votos de seus membros.

§ 4º Todos os membros devem justificar seu voto por escrito.

§ 5º A sessão de julgamento antecede a feitura do relatório.

Art. 29. Elaborado o relatório, com termo de encerramento, o presidente remete o processo ao Comandante-Geral.

 

CAPÍTULO III

DA SOLUÇÃO

 

Art. 30. Recebidos os autos do Conselho de Disciplina, o Comandante-Geral, motivadamente, solucionará, determinando:

I - o arquivamento do processo, se não julga o militar estadual culpado;

II - a aplicação de sanção disciplinar, se considera o acusado culpado das acusações imputadas, no todo ou em parte;

III - a exclusão a bem da disciplina, se julgar o militar estadual culpado das acusações imputadas e incapaz de permanecer na ativa ou na situação em que se encontra na inatividade;

IV - a remessa do processo ao Juízo competente, se considera infração penal a razão pela qual o acusado foi julgado culpado;

V - a remessa do processo ao Órgão de segunda instância da Justiça Militar estadual, se o Conselho de Disciplina tiver sido instaurado com fundamento no inciso V do art. 5º desta lei, e considere o acusado incapaz de permanecer na ativa ou na situação em que se encontra na inatividade.

Parágrafo único. A solução do Comandante-Geral não está adstrita ao relatório do Conselho de Disciplina.

 

Nas Forças Armadas4, como dito anteriormente, o CD está disciplinado no Decreto nº 71.500/72, onde os arts. 1º e 2º expressam o seguinte:

 

Art. 1º. O Conselho de Disciplina é destinado a julgar da incapacidade do Guarda-Marinha, do Aspirante-a-Oficial e das demais praças das Forças Armadas com estabilidade assegurada, para permanecerem na ativa, criando-lhes, ao mesmo tempo, condições para se defenderem.

Parágrafo único. O Conselho de Disciplina pode, também, ser aplicado ao Guarda-Marinha, ao Aspirante-a-Oficial e às demais praças das Forças Armadas, reformados ou na reserva remunerada, presumivelmente incapazes de permanecerem na situação de inatividade em que se encontram.

Art. 2º. É submetida a Conselho de Disciplina, "ex officio", a praça referida no artigo 1º e seu parágrafo único.

I - acusada oficialmente ou por qualquer meio lícito de comunicação social de ter:

a) procedido incorretamente no desempenho do cargo;

b) tido conduta irregular; ou

c) praticado ato que afete a honra pessoal, o pundonor militar ou decoro da classe;

II - afastado do cargo, na forma do Estatuto dos Militares, por se tornar incompatível com o mesmo ou demonstrar incapacidade no exercício de funções militares a ele inerentes, salvo se o afastamento é decorrência de fatos que motivem sua submissão a processo;

III - condenado por crime de natureza dolosa, não previsto na legislação especial concernente à segurança do Estado, em tribunal civil ou militar, a pena restritiva de liberdade individual até 2 (dois) anos, tão logo transite em julgado a sentença; ou

IV - pertencente a partido político ou associação, suspensos ou dissolvidos por força de disposição legal ou decisão judicial, ou que exerçam atividades prejudiciais ou perigosas à segurança nacional.

Parágrafo único. É considerada entre os outros, para os efeitos deste decreto, pertencente a partido ou associação a que se refere este artigo a praça das Forças Armadas que, ostensiva ou clandestinamente:

a) estiver inscrita como seu membro;

b) prestar serviços ou angariar valores em seu benefício;

c) realizar propaganda de suas doutrinas; ou

d) colaborar, por qualquer forma, mas sempre de modo inequívoco ou doloso, em suas atividades.

 

Da leitura dos arts. 1º e 2º do Decreto nº 71.500/1972 extrai-se, resumidamente, que estarão submetidos ao CD os militares da ativa, da reserva remunerada e os reformados quando cometerem atos que, supostamente, os incapacitem para se manterem na atividade ou se inativos, de permanecerem na reserva remunerada ou reforma.

Diante das alterações efetivadas pela Lei nº 13.954/2019 no art. 3º da Lei nº 6.880/1980, os militares das Forças Armadas estão em uma das seguintes situações:

 

Art. 3°. Os membros das Forças Armadas, em razão de sua destinação constitucional, formam uma categoria especial de servidores da Pátria e são denominados militares.

§ 1° Os militares encontram-se em uma das seguintes situações:

a) na ativa:

I - os de carreira;

II - os temporários, incorporados às Forças Armadas para prestação de serviço militar, obrigatório ou voluntário, durante os prazos previstos na legislação que trata do serviço militar ou durante as prorrogações desses prazos; (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

III - os componentes da reserva das Forças Armadas quando convocados, reincluídos, designados ou mobilizados;

IV - os alunos de órgão de formação de militares da ativa e da reserva; e

V - em tempo de guerra, todo cidadão brasileiro mobilizado para o serviço ativo nas Forças Armadas.

b) na inatividade:

I - os da reserva remunerada, quando pertençam à reserva das Forças Armadas e percebam remuneração da União, porém sujeitos, ainda, à prestação de serviço na ativa, mediante convocação ou mobilização; e

II - os reformados, quando, tendo passado por uma das situações anteriores estejam dispensados, definitivamente, da prestação de serviço na ativa, mas continuem a perceber remuneração da União.

III - os da reserva remunerada e, excepcionalmente, os reformados, que estejam executando tarefa por tempo certo, segundo regulamentação para cada Força Armada. (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

§ 2º Os militares de carreira são aqueles da ativa que, no desempenho voluntário e permanente do serviço militar, tenham vitaliciedade, assegurada ou presumida, ou estabilidade adquirida nos termos da alínea “a” do inciso IV do caput do art. 50 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

§ 3º Os militares temporários não adquirem estabilidade e passam a compor a reserva não remunerada das Forças Armadas após serem desligados do serviço ativo. (Incluído pela Lei nº 13.954, de 2019)

 

A alínea a do inciso IV do art. 50 da Lei nº 6.880/1980 assim dispõe:

 

Art. 50. São direitos dos militares:

(...)

IV - nas condições ou nas limitações impostas por legislação e regulamentação específicas, os seguintes:

a) a estabilidade, somente se praça de carreira com 10 (dez) anos ou mais de tempo de efetivo serviço; (Redação dada pela Lei nº 13.954, de 2019)

(...)

 

Então, conclui-se que, dentre as Praças das Forças Armadas, somente as com estabilidade assegurada, adquirida com suporte na alínea a do inciso IV do art. 50 da Lei nº 6.880/1980, possuidoras de 10 (dez) anos ou mais de tempo de efetivo serviço, estarão sujeitas ao CD.

A jurisprudência já ratificou que essa norma somente é aplicável, além do Guarda-Marinha e do Aspirante-a-Oficial, às Praças estáveis5, podendo-se citar a seguinte decisão do TRF3 do ano de 2020:

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO MILITAR SEM ESTABILIDADE. SANÇÃO DISCIPLINAR. LICENCIAMENTO. ENFERMIDADE. TRATAMENTO MÉDICO. - A pretensão recursal consiste em reforma de sentença que nos autos de ação ordinária proposta em face da União, objetivando provimento jurisdicional declaratório de nulidade do ato de licenciamento do autor, bem como declaração de seu direito à reforma com soldo calculado com base no grau hierárquico imediatamente superior, além de indenização por danos morais, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, tão somente para determinar sua reintegração temporária, com percepção da remuneração da graduação que ostentava quando do licenciamento, na condição de adido, para tratamento de saúde, até a alta médica. - Colhe-se dos autos que o autor era aluno do curso de Sargentos da Escola de Especialistas da Aeronáutica (EEAR), enquadrando-se, portanto, na categoria de praça especial, com regime jurídico definido no art. 1º c/c art. 3º, VI, do Estatuto dos Militares (Lei 6.880/80). A lide envolve, assim, militar sem garantia de estabilidade porque o art. 50, IV, "a" do citado estatuto preceitua que os praças somente desfrutarão da estabilidade quando implementar tempo de serviço superior a 10 (dez) anos, o que não se verificou no caso concreto. - A teor do que dispõem os artigos 94, 121, II, "c", bem assim o art. 125 do Estatuto dos Militares, a inclusão de militar de serviço ativo das Forças Armadas e o consequente desligamento da organização podem decorrer, dentre outros motivos, do licenciamento, sendo certo que uma das modalidades por meio das quais este se efetiva é "a bem da disciplina". Assinale-se que, como bem esclareceu o juízo de origem, é juridicamente possível o desligamento do militar não estável do serviço ativo por ato administrativo discricionário do Comandante, sem que, para tanto, se exija a instalação do Conselho de Disciplina, sendo lícito que tal se faça por meio de "Formulário de Apuração de Transgressão Militar", desde que assegurados o contraditório e a ampla defesa. - No caso dos autos, pesa contra o autor acusação de transgressão militar grave e infamante e, por ter se ausentado de seu posto à justificativa dada posteriormente de que um parente havia sido sequestrado, fato que se comprovou inverídico. O autor sustenta a nulidade do processo de desligamento por violação ao devido processo legal. Não assiste razão ao autor quanto a este fundamento. - Como bem explicado na sentença, embora o procedimento tenha sido sumário, o que é lícito para os casos de desligamento de militar não estável, foi oportunizada ao autor a possibilidade de oferecer defesa por escrito e isso foi feito, afastando, então, qualquer violação aos princípios do contraditório e da ampla defesa ou mesmo do devido processo legal. - Ao interpretar a legislação de regência da matéria (artigos 106, II, e 108, VI, do Estatuto dos Militares), especificamente quanto à pretensão em tela, o juízo singular chegou à melhor conclusão ao ponderar que, o militar sem garantia de estabilidade, atingido pelo licenciamento a bem da disciplina, não poderia se beneficiar pelo instituto da reforma, quando não restou comprado que a doença que o acometia guardava relação direta com a atividade militar e também não constituía enfermidade apta a tornar o militar inválido para qualquer tarefa. - Apelação desprovida. (TRF3 – AC nº 0007505-31.2015.4.03.6100 - 2ª Turma, - Relator Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES – e-DJF3 de 22.04.2020)

 

Importante tecer alguns comentários sobre o parágrafo único do art. 1º do Decreto nº 71.500/1972, na parte que informa que os militares reformados também estarão sujeitos ao CD:

 

Parágrafo único. O Conselho de Disciplina pode, também, ser aplicado ao Guarda-Marinha, ao Aspirante-a-Oficial e às demais praças das Forças Armadas, reformados ou na reserva remunerada, presumivelmente incapazes de permanecerem na situação de inatividade em que se encontram.

 

O TRF3 possui decisão de 2014 contrariando esse dispositivo castrense, negando a possibilidade de perda da reforma do militar das Forças Armadas com suporte na Súmula nº 56 do STF, conforme se verifica nas respectivas ementa e súmula:

 

MILITAR REFORMADO - CONDENAÇÃO CRIMINAL - EXCLUSÃO DA INATIVIDADE REMUNERADA - ILEGALIDADE. I - Mandado de segurança impetrado em face de ato praticado pelo Comando da Marinha que, mesmo diante do parecer do Conselho de Disciplina no sentido de que o impetrante não era incapaz de permanecer na condição de reformado, entendeu por bem em excluí-lo da inatividade remunerada em decorrência de condenação criminal pela prática do crime de tráfico de drogas posteriormente à sua inatividade. II - Ato que ultrapassou os limites da discricionariedade administrativa, pois o inciso IV do artigo 13 do Decreto 71.500/1972 parte do pressuposto de que o Conselho Disciplinar proceda ao julgamento prévio do militar e o tenha considerado culpado ou incapaz, o que não ocorreu. III – O militar reformado não se sujeita à pena disciplinar (Súmula 56 do Supremo Tribunal Federal). Punição que afronta fundamento republicano, qual seja, a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal de 1988). IV - Recurso provido. Segurança concedida. (TRF3 – AC nº 0000002-10.2002.4.03.6004 – 2ª Turma – Relator Desembargador Federal Cotrim Guimarães – e-DJF3 de 19.11.2014)

 

SÚMULA nº 56 do STF: Militar reformado não está sujeito à pena disciplinar.

 

Todavia, o STJ possui decisão de 2011 permitindo a exclusão do militar reformado das Forças Armadas em decorrência de decisão de Conselho de Disciplina:

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. ANÁLISE DE DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA DO ESPECIAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 535, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. OMISSÃO NÃO CONFIGURADA. MILITAR REFORMADO. PRÁTICA DE CONDUTAS TIPIFICADAS COMO CRIME APÓS A REFORMA. SUBMISSÃO A CONSELHO DE DISCIPLINA. EXCLUSÃO DAS FILEIRAS DAS FORÇAS ARMADAS. POSSIBILIDADE. 1. A via especial, destinada à uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional, não se presta à análise de possível violação a dispositivos da Constituição da República. 2. O acórdão hostilizado solucionou a quaestio juris de maneira clara e coerente, apresentando todas as razões que firmaram o seu convencimento. 3. Havendo expressa previsão na legislação quanto à possibilidade de aplicação de sanção disciplinar aos militares reformados, é de ser afastada a incidência da Súmula n.º 56 do Supremo Tribunal Federal. 4. A prática de condutas que afetem o dever, o pundonor e o decoro militar é passível de acarretar, para o militar, a declaração de incapacidade quanto à permanência nas fileiras das Forças Armadas, inclusive quando já tenha sido reformado. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (STJ - REsp nº 1121791/RJ – 5ª Turma - Relatora Ministra Laurita Vaz - DJe de 14.10.2011)

 

Porém, é interessante o fato de que, embora as legislações estaduais e distrital sobre Conselho de Disciplina tenham, a princípio, se baseado no Decreto nº 71.500/1972, algumas, e raras, não submetem seus militares reformados ao CD, podendo-se citar o caput do art. 88 da Lei nº 13.407/2003 do Estado do Ceará e o art. 76 da LC nº 893/2001 do Estado de São Paulo :

 

Art. 88. O Conselho de Disciplina destina-se a apurar as transgressões disciplinares cometidas pela praça da ativa ou da reserva remunerada e a incapacidade moral desta para permanecer no serviço ativo militar ou na situação de inatividade em que se encontra.

 

Artigo 76 - O Conselho de Disciplina destina-se a declarar a incapacidade moral da praça para permanecer no serviço ativo da Polícia Militar e será instaurado:

I - por portaria do Comandante da Unidade a que pertencer o acusado;

II - por ato de autoridade superior à mencionada no inciso anterior.

Parágrafo único - A instauração do Conselho de Disciplina poderá ser feita durante o cumprimento de sanção disciplinar.

 

Em relação aos Oficiais, o Conselho de Justificação6 (CJ) é o processo administrativo7 disciplinar destinado a julgar, exclusivamente, o Oficial de carreira, ou seja, o Oficial temporário não será submetido ao CJ.

O objetivo do CJ é para verificar a incapacidade do Oficial de carreira para permanecer na ativa ou inatividade, conforme se depreende da leitura do art. 1º da Lei nº 5.836/1972, sendo que, dependendo do caso concreto8, poderá ser processado e julgado pela própria Força Armada e/ou pelo STM, conforme previsões dispostas nos arts. 13 e 14 da referida lei:

 

Art. 1º. O Conselho de Justificação é destinado a julgar, através de processo especial, da incapacidade do oficial das Forças Armadas - militar de carreira - para permanecer na ativa, criando-lhe, ao mesmo tempo, condições para se justificar.

Parágrafo único. O Conselho de Justificação pode, também, ser aplicado ao oficial da reserva remunerada ou reformado, presumivelmente incapaz de permanecer na situação de inatividade em que se encontra.

 

Art. 13. Recebidos os autos do processo do Conselho de Justificação, o Ministro Militar, dentro do prazo de 20 (vinte) dias, aceitando ou não seu julgamento e, neste último caso, justificando os motivos de seu despacho, determina:

I - o arquivamento do processo, se considera procedente a justificação;

II - a aplicação de pena disciplinar se considera contravenção ou transgressão disciplinar a razão pela qual o oficial foi julgado culpado;

III - na forma do Estatuto dos Militares, e conforme o caso, a transferência do acusado para a reserva remunerada ou os atos necessários a sua efetivação pelo Presidente da República, se o oficial foi considerado não habilitado para o acesso em caráter definitivo;

IV - a remessa do processo ao auditor competente, se considera crime a razão pela qual o oficial foi considerado culpado;

V - a remessa do processo ao Superior Tribunal Militar:

a) se a razão pela qual o oficial foi julgado culpado está previsto nos itens I, III e V do artigo 2º; ou

b) se, pelo crime cometido prevista nos itens IV do artigo 2º o oficial foi julgado incapaz de permanecer na ativa ou na inatividade.

Parágrafo único. O despacho que julgou procedente a justificação deve ser publicado oficialmente e transcrito nos assentamentos do oficial, se este é ativa.

 

Art. 14. É da competência do Superior Tribunal Militar julgar, em instância única, os processos oriundos de Conselhos de Justificação, a ele remetidos por Ministro Militar.

 

As condenações do militar mediante CD (exclusões ou reformas a bem da disciplina) são passíveis de análise pelo Poder Judiciário, podendo, dependendo do caso concreto, serem anuladas com a reintegração do militar à anterior graduação, conforme será estudado no decorrer desse Capítulo.

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1ADMINISTRATIVO. MILITAR. EXPULSÃO DE CABO DAS FILEIRAS DA MARINHA A BEM DA DISCIPLINA. PEDIDO DE ANULAÇÃO DO ATO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ENFERMIDADE QUE JUSTIFICASSE AS FALTAS DISCIPLINARES COMETIDAS. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE REFORMA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR REGULAR. OPORTUNIDADE DE DEFESA. RECURSO IMPROVIDO. 1. O Autor foi submetido a Conselho de Disciplina por ter apresentado no decurso de sua carreira conduta irregular, sofrendo diversas punições, tendo cumprido, no ano de 1998, cinquenta dias de prisão rigorosa e perdido um total de cento e vinte pontos, quando bastariam apenas 30 dias daquele tipo de prisão, num espaço de um ano, e 90 pontos perdidos para que fosse instaurado aquele procedimento. 2. Alegação do Autor de que tais transgressões disciplinares teriam sido ocasionadas por enfermidade que se lhe instalou à época, diagnosticada como Transtorno de Ajustamento. Sustenta ainda ser dependente químico, o que corroboraria também para as atitudes indevidas. 3. Em Inspeções de Saúde realizadas ao longo do período de prestação do serviço militar o Autor obteve sempre laudo de Apto para o serviço. Até mesmo quando levantada pela Marinha a hipótese diagnóstica de Reação de Ajustamento ou mesmo diante da alegada dependência química defendida pelo Autor, apresentava-se ele sempre lúcido, orientado, com pensamento coerente e sem sintomas psicóticos, não havendo prejuízo da capacidade de entendimento e de auto-determinação, encontrando-se apto a responder por seus atos e desenvolver atividades produtivas. Em perícia médica realizada a cargo do Juízo não foi verificada qualquer patologia psiquiátrica no periciado. 4. Encontra-se sobejamente comprovada a inexistência de qualquer incapacidade atual ou remota que possa garantir ao Autor a anulação de sua exclusão a bem da disciplina ou a concessão da reforma pretendida. 5. É princípio basilar de Direito Processual que ao Autor cabe a comprovação do fato constitutivo do direito alegado, nos termos do art. 333, I, do CPC, ônus do qual o ex-militar não conseguiu se desincumbir, não havendo como o Juízo trabalhar à base de suposições. 6. Despicienda a tese do Autor de que não lhe foi ofertada oportunidade de defesa, eis que sua exclusão das Forças Armadas resultou de instauração de processo administrativo disciplinar regular, em que foi informado de que poderia comparecer acompanhado de Oficial defensor, tendo tomado ciência de todos os atos do processo e dele participado ativamente. 7. Recurso improvido. (TRF2 - AC nº 200151010030398 – 5ª Turma Especializada – Relator Desembargador Federal Guilherme Diefenthaeler - E-DJF2R de 10.07.2013)

2ADMINISTRATIVO. POLICIAL MILITAR. EXCLUSÃO DA CORPORAÇÃO. SESSÃO SECRETA DE JULGAMENTO DO CONSELHO DE DISCIPLINA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DO ACUSADO E DE SEU DEFENSOR. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. 1. Segundo entendimento desta Corte, é ilegal a ausência de intimação do acusado e de seu defensor para acompanhamento da sessão secreta do Conselho de Disciplina que deliberou sobre a exclusão daquele dos quadros da Polícia Militar, em razão dos princípios do contraditório e da ampla defesa, assegurados pela Constituição Federal. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg nº RMS 25.414/PB – 5ª Turma - Relator Ministro Jorge Mussi - DJe de 06.09.2012)

3Importante esclarecer que há legislações previdenciárias que não conferem o direito dos beneficiários do militar (Policial e Bombeiro Militar) à pensão militar em caso de exclusão a bem da disciplina, seja por meio do Conselho de Disciplina ou por condenação penal transitada em julgado à pena superior a 2 (dois) anos de restritiva de liberdade. (ex.: O Estado do Rio Grande do Norte revogou tal benefício aos beneficiários do militar em 2005, ou seja, o Policial Militar do RN que for excluído a bem da disciplina, além de não receber quaisquer indenizações, não deixará pensões militares aos seus beneficiários).

 

4O art. 49 da Lei nº 6.880/1980 assim dispõe:

Art. 49. O Guarda-Marinha, o Aspirante-a-Oficial e as praças com estabilidade assegurada, presumivelmente incapazes de permanecerem como militares da ativa, serão submetidos a Conselho de Disciplina e afastados das atividades que estiverem exercendo, na forma da regulamentação específica.

§ 1º O Conselho de Disciplina obedecerá a normas comuns às três Forças Armadas.

§ 2º Compete aos Ministros das Forças Singulares julgar, em última instância, os processos oriundos dos Conselhos de Disciplina convocados no âmbito das respectivas Forças Armadas.

§ 3º A Conselho de Disciplina poderá, também, ser submetida a praça na reserva remunerada ou reformada, presumivelmente incapaz de permanecer na situação de inatividade em que se encontra.

5ADMINISTRATIVO - MILITAR TEMPORÁRIO – (...). 4. É incabível a instauração de Conselho de Disciplina para julgar militares não estáveis, como é o caso dos autos, a luz do disposto no art. 49 da Lei 6.880/80 (Estatuto dos Militares). 5. Apelo improvido. (TRF2 - AC nº 200551010137514 – 7ª Turma Especializada – Relator Desembargador Federal José Antônio Lisboa Neiva - E-DJF2R de 23.02.2011)

6Não me aprofundarei no estudo do Conselho de Justificação, porém, provavelmente, poderá ser, futuramente, mais um capítulo deste livro.

7AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. 2. DECISÃO DO CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO. NATUREZA ADMINISTRATIVA. 3. INCABÍVEL A INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRECEDENTES DESTA CORTE. 3. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (STF - AI nº 811709 AgR – 2ª Turma - Relator Ministro Gilmar Mendes – DJe de 06.12.2010)

8CONSELHO DE JUSTIFICAÇÃO. LEI Nº 5.836/72. CONSTITUIÇÃO FEDERAL. RECEPÇÃO. COMANDANTE. CONDUTA. ÉTICA. PUNDONOR MILITAR. ESTATUTO DOS MILITARES. A Lei nº 5.836/72 encontra-se em plena harmonia com o disposto no art. 142, inciso IV, da Constituição Federal. Os dispositivos da Lei nº 9.784/99, que regula a tramitação dos processos administrativos no âmbito da Administração Pública Federal, não incidem nos processos que possuem rito específico, como é o caso do Conselho de Justificação. O encaminhamento do Conselho a esta Corte não constitui instauração de novo processo e sim prosseguimento, no âmbito jurisdicional, do processo de natureza administrativa que teve seu regular trâmite na via originária. Julgamento que, por se restringir exclusivamente ao campo ético-moral, não se confunde ou se sobrepõe àquele realizado na esfera penal, descabendo, assim, falar em Tribunal paralelo ou em bis in idem. In casu, o Justificante não reúne mais as condições necessárias para permanecer na ativa, uma vez que com sua conduta infringiu o Estatuto dos Militares, cujos incisos II, IV e XIII, do artigo 28, e inciso III, do artigo 31, versam, respectivamente, sobre a ética e sobre os deveres dos militares. A decretação da reforma do Justificante constitui a solução que se apresenta em harmonia com o princípio da proporcionalidade. Rejeição da Preliminar. Decisão unânime. Oficial julgado incapaz de permanecer no Serviço Ativo da Aeronáutica, determinando-se, por conseguinte, a sua reforma. Decisão majoritária. (STM – Conselho de Justificação nº 0000054-56.2012.7.00.0000 – Relator Ministro Luis Carlos Gomes Mattos – DJe de 12.08.2013)

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